dezembro 03, 2025

A insustentável leveza de um cafuné

A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DE UM CAFUNÉ
Hayton Rocha 


No Japão, onde o tempo parece andar de quimono e sandálias de palha, já é possível alugar uma avó por hora. Sim, você não leu errado: avó por hora, como quem reserva mesa em restaurante ou carro de locadora. O kit inclui broncas embrulhadas em papel celofane, receitas de molhos seculares e aquele olhar que já viu o mundo desmoronar algumas vezes e, ainda assim, achou forças para varrer os cacos.


A agência anuncia uma centena de senhoras, entre 60 e 94 anos, como se fossem modelos de catálogo: “ideal para ajudar nas tarefas de casa, ensinar a costurar, reconciliar-se com a sogra ou apenas preencher o vazio deixado por uma pessoa querida que partiu”. A promessa é sabedoria, mas o que realmente se aluga é o antídoto contra a solidão.


 

Ilustração: Uilson Morais (Umor)

Nesse contrato tácito, os netos terceirizados nada têm a perder: aprendem truques domésticos, recebem lições de sobrevivência conjugal e ainda podem ser embalados por histórias que misturam samurais heroicos com gueixas enigmáticas. Já as avós, protagonistas desse teatro doméstico, recebem o que mais lhes falta: olhos de ver, ouvidos de ouvir. Afinal, ninguém quer morrer sem testemunhas de suas versões, ainda que repetidas pela enésima vez.

 

A comédia, porém, flerta com a tragédia. Milhões de japoneses vivem sozinhos, destinados a morrer na invisibilidade. A solidão lá já tem até nome próprio: kodokushi, “morte solitária”. Uma epidemia traiçoeira, dessas que não pedem máscara nem respiradores, mas exigem coragem e resignação. Apartamentos trancados, celulares mudos, mensagens sem resposta. A nação que inventou robôs para servir água agora tenta preencher o vazio existencial com avós terceirizadas e cafunés tarifados.

 

As estatísticas, frias como sempre, sustentam o pano de fundo: daqui a pouco, um terço da população japonesa terá mais de 65 anos, a maioria mulheres. Vidas prolongadas pela medicina, mas encurtadas pelo deserto das relações. O que era bênção virou sentença: viver muito, por lá, é quase sinônimo de viver só.

 

E não se engane: o bilhete é de ida e já tem data marcada para o Brasil. Ainda temos avós no fogão a lenha, sustentando famílias com pensões minguadas. Mas o mesmo país que exalta a sabedoria popular de uma avó em propaganda de presunto é o que fecha a porta para quem tem mais rugas que curtidas nas redes sociais. Aqui, cabelos brancos assustam mais que juros de cartão de crédito em atraso.

 

Chamam de “autoetarismo” a praga que corrói por dentro: gente que se convence de que já está velha demais para aprender ou recomeçar. Como se a idade fosse sentença de morte civil. Esquecem que a velhice, quando bem vivida, é o único diploma que não se compra na internet. Maturidade e paciência são artigos de luxo, mas o mercado insiste em preferir um jovem ansioso que enfeita PowerPoint a um idoso sereno, vertendo sabedoria por todos os poros.

 

Daqui a pouco, seremos nós a adotar o aluguel de avós. Não para ensinar etiqueta social, mas para destrinchar manobras do submundo político, temperar o feijão no ponto ou explicar por que descobrimos rugas em lugares que nem sabíamos que existia. O risco é o mercado transformar essas mulheres em “influencers da saudade”, cobrando por hora de colo e minuto de cafuné. Carinho tabelado em Excel, com desconto progressivo para pacotes semanais.

 

E o problema não é cobrar pelo afeto — já fazemos isso com babás eletrônicas e lares de idosos. O problema é acreditar que esse simulacro resolve a orfandade social que nós mesmos fabricamos. A mesma sociedade que chama aposentado de peso é a que depois corre para alugá-lo quando percebe que, sem ele, a vida perde cheiro, sabor e até os macetes da língua pátria.

 

Se a humanidade precisa terceirizar até o amor que só uma avó sabe dar, o problema não está na falta de netos, mas no excesso de órfãos de convivência. Gente aparentemente viva, mas desconectada, perdida entre compromissos virtuais. Num mundo em que até dividir a senha do Wi-Fi virou sacrifício, talvez o maior luxo seja ter alguém que bata à porta sem mandar antes mensagem. Porque não há algoritmo que ensine a receita de sopa que cure mágoas, nem que borde ternura nas frestas do dia a dia. Isso só avó sabe fazer.

 

Nessa toada, um dia não restará avó nem para alugar. E quando estivermos sozinhos, com nossos celulares mudos, talvez notemos tarde demais que o verdadeiro luxo nunca foi o carro elétrico ou o último smartphone lançado no mercado, mas alguém que nos chamasse pelo apelido de infância enquanto nos fazia um cafuné.





51 comentários:

  1. Excelente! Hayton deveria criar um canal no YouTube para contar seus contos, pois eles pedem mais que leitura.

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  2. Que profunda e sensível construção literária. De fato, a solidão conectada é praga do Séc XXi. Pessoas que o celular para elas virou uma espécie de respirador artificial. E, as pessoas vão se sentindo sozinhas, na multidão. Avós têm muito a ensinar a esta sociedade. Como bem você falou, os avós podem serem alugados pela vida moderna para ensinarem o dom da escuta, do cuidado, da ternura dos gestos, do rompimento de padrões que tinham, até os netos chegarem e bagunçarem paradigmas. Sim amigo Hayton, a matéria é surreal e revela a ponta do iceberg social em que nos metemos, como humanidade, que precisa hoje criar namoradas no ChatGpt, por exemplo, e ainda acreditar que são reais esses relacionamentos. Como diria o meme: " meu filho, você vai ver coisas..." Para não perder o motel, meu aluguel está no mercado também. Tenho as quartas e quintas livre. Cobro baratinho, desde que a pessoa que me alugar goste de Chico Buarque,cadê Xangai, de Jessie Quirino, de bode, cuscuz e buchada.

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    1. A crônica pode ter ficado legal, mas a ilustração de meu querido amigo UMor captou inclusive o olhar saliente do brasileiro quando está em jogo a contratação de uma mulher para um trabalho não previsto na CLT.

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    2. Você sempre muito generoso, meu querido amigo!… Não fosse sua criatividade não haveria a inspiração pro rabisco.

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  3. Bom dia Caro Amigo Parahyba!
    Hoje você botou pra esbugalhar! Até Satiko, para quem acabo de ler em voz alta a crônica de hoje, está com os olhos orientais marejados.
    As verdades explicitadas à sorrelfa gritam altíssimo para um tempo que já bate à porta de todos nós brasileiros.
    Vida moderna com prenúncio de retorno. E, o pior, sem saber para onde voltar.
    Excelente dia🤝
    Parabéns.🙏

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  4. Caro Hayton.

    Notável como sua crônica transforma uma notícia aparentemente bizarra — o aluguel de avós no Japão — em uma análise incisiva da nossa falência social, fazendo uma contraposição entre o carinho genuíno e a terceirização do afeto.
    O que me impressiona é a progressão narrativa: você começa com a peculiaridade nipônica, introduz o termo cirúrgico 'kodokushi' (morte solitária), e rapidamente desvia o foco para o espelho brasileiro, onde o "autoetarismo" e a desvalorização do idoso já pavimentam a chegada desse mesmo mercado de "influencers da saudade".
    Uma crítica elegantemente construída, especialmente na observação de que a sociedade que marginaliza o aposentado é a mesma que, paradoxalmente, sente falta da sabedoria que só ele detém — seja para "destrinchar manobras do submundo político" ou para o simples, mas vital, "temperar o feijão".
    Pessoalmente gostei demais da exposição da grande ironia: o problema não é a falta de netos, mas o "excesso de órfãos de convivência". É a denúncia de uma humanidade que, de tão conectada virtualmente, está profundamente desconectada do essencial. Então, o cafuné, nesse contexto, deixa de ser um gesto trivial e se torna o último e mais caro artigo de luxo. É uma reflexão profunda e necessária

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  5. Crônica incrível para reflexão. Parabéns!

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  6. Viver muito é uma sentença de morte. Estamos todos no corredor da morte esperando o cumprimento da sentença.

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    1. Isa, muito chocante, embora verdadeira sua observação, que aliás nos deprime um pouco !

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    2. Creio que quanto mais se vive, menos se morre... e que a morte me encontre viva.

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  7. Essa crônica não vai sair da minha cabeça.
    Confesso que fico mais feliz do que triste em saber que há quem cuida da solidão buscando uma companhia, ainda que de uma avó contratada. Isso não afasta o drama que imagino ser a solidão, ainda mais na velhice, mas ao menos o remédio é daqueles que parece não ter efeito colateral.
    De cara me veio à lembrança Mario Quintana: “a arte de viver é simplesmente a arte de conviver”. Não há receita mais eficaz para a vida do que conviver. É vital ter alguém pra ouvir, pra falar, pra sentir, pra fazer companhia, pra dar aconchego.
    Viva Mário Quintana!
    Viva você, grande Hayton!

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  8. É muito interessante como somos capazes de criar problemas complexos e depois tentamos resolver com soluções aparentemente simples, mas totalmente incoerentes, ingênuas e quase sempre ineficazes.
    A crônica capta com maestria o fenômeno. Hipervalorizamos o novo só porque é novo, independente de ser bom. E descartamos o antigo, mesmo que seja bom. Depois ficamos fazendo remendos.
    É estarrecedora nossa capacidade - como humanos - de viver em permanentes paradoxos!

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  9. Bela e sensivel cronica! Amor, carinho, afeto, sorriso cumplice e cheirinho de vó nao tem preço. Aluguel de avó é sintoma de algo errado no convivio familiar nos dias de hoje.

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  10. É uma triste realidade vivenciada no Japão e em outros recantos do mundo.
    Precisamos retomar nossa conexão com a natureza, com o amor efetivo, com nossos pares e com a vida real. O mundo e suas tecnologias estão criando pessoas robotizadas, e isso gera a incapacidade de valorizar um carinho, o idoso e as pessoas do nosso convívio. É uma realidade nua e crua que precisa ser modificada.
    Devemos evitar a morte solitária (Kodokushi) e buscar com urgência a vivência coletiva.
    Como sempre o Umor brinda-nos com sua pitadas de humor. Acho que a Vovó Shirley seria uma boa para os 80+.🤣🤣🎯

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  11. Duas horas depois da chegada de sua crônica, recebi, aqui no zap, a seguinte mensagem:

    "Vovô, você pode ficar comigo de manhã hoje? E me levar pra aula depois do almoço?"

    Fico feliz com esse tipo de pedido e quase sempre tenho possibilidade de atender e o faço com muito prazer, para curtir a presença de meu neto.
    Luiz Andreola

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  12. ROBERTO SANTOS FERNANDES3 de dezembro de 2025 às 07:53

    Excelente crônica!
    Eu não tive o prazer de conviver com meus avós pois, quando nasci eles já eram falecidos. Deve ser muito bom receber esse carinho especial que os avós dedicam a seus netos.

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  13. Sensibilidade em estado puro! Parabéns, Hayton. Abração,
    Gradim.

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  14. Demais essa crônica.
    Esse assunto interessa a tantos, vez que somos muitos nessa condição, o que nos leva a refletir: o que precisa mudar para reconhecerem o valor dos velhinhos?

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  15. O carinho da vovó
    Não tem paga, não tem preço
    É tão bom, tão confortável
    Até acho que mereço
    Pois viver na solidão
    Desafia a razão
    Não tenho nenhum apreço.

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  16. Muito bom, Hayton. Sua crônica de hoje nos faz desacelerar o corre-corre da vida e olhar pelo retrovisor. O “serviço de aluguel de avós”, que vem crescendo no Japão, revela a necessidade de resgatar o afeto, o cuidado e o sabor antigo do feijão — como você bem destacou. Em um mundo em que quase toda a atenção está voltada para as telas dos smartphones, essa lembrança do aconchego e da presença humana se torna ainda mais necessária em uma época de isolamento e falta de iteração física. Sacada inteligente e oportuna para os tempos atuais. Excelente crônica. Parabéns!

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  17. Entendi exatamente seu comentário por ser avó e bisavó Dayse lanzac

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  18. Uma permuta de companhia e solidão. De aprendizado e sabedoria. Gratificante seria poder esvaziar os "depósitos de idosos"(abrigos), adotando-se um avô/avó, símbolos do conhecimento adquirido durante a vida.

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  19. Realmente, essa relação Avô/Vó x netos é muito especial. Talvez por isso a carência na sociedade japonesa... e não só!
    Excelente crônica, por inteiro. Mas, os últimos 03 parágrafos são profundos.

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  20. Não sou avó, mas uma tia avó que tem muito orgulho de ser procurada pelas sobrinhas netas para assessora-las, o que faço com o maior prazer e carinho, e quem ganha mais com isso sou eu mesma que desfruto de momentos prazerosos na companhia delas.

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  21. ADEMAR RAFAEL FERREIRA3 de dezembro de 2025 às 09:56

    Atualmente por ser avô de três netos e ver como Dona Helaine, minha esposa, tratar cada um deles e ainda sobrar tempo para os "sobrinhos netos" não tenho dúvida somos o elo que liga a vida real com os pais a mundo de fantasia. Belo texto.

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  22. Que show de crônica, Hayton. Viajei pelo tempo e revivi os carinhos, cuidados e ensinamentos, pra lá de especiais, dispensados por minhas amadas e saudosas avós.

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  23. Magnífica, sua crônica, Hayton!

    Existe um ditado popular, que diz que amor de vó é dobrado. Mas, no caso das avós japonesas, deve ser triplicado. Só o fato de saírem da solidão, o amor a ser oferecido aos seus netos adotivos, com certeza vai muito de além de meros cafunés.

    Lembrei de uma frase de minha avó paterna, que ela sempre usava quando chegava em sua casa, “o Senhor já almoçou? Venha cá comer uma coalhada”. Era como se a coalhada, fosse a sobremesa. Já minha avó materna, era de contar histórias de quando era criança como os netos.

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  24. Alceu Valença cantou que "a solidão é fera, a solidão devora", o que me faz pensar no que fazer para domá-la. Talvez dar amor e nunca abandonar seja uma maneira. Se a solidão não for um destino, é possível que quem nunca abandone também nunca fique sozinho.

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  25. Crônica maravilhosa!
    Não pude desfrutar desses carinhos dos meus antepassados, mas na direção contrária, sendo o agente da ação para com os netos, procuro tê-los em nosso convívio da forma mais harmoniosa, para que possam guardar boas recordações.
    É uma triste realidade essa do Japão, no preenchimento do vazio existencial. Mas é um fato cada vez mais concreto, diante dos algoritmos não humanos a dominar o cotidiano.
    Como o Marcos Vieira lembrou tão bem o Alceu Valença, dou-me a liberdade de complementar sugerindo Oswaldo Montenegro, na música "Solidões", que descreve uma série de situações que definem o tema tratado tão bem na crônica, a exemplo desse trecho:
    ​"A solidão é como um pássaro ferido
    Que voou, mas está perdido, sem saber a direção
    É como mão sem outra mão para bater palma
    Como um Deus que perde a calma se ninguém pedir perdão".
    Que bom que um texto tão bem elaborado não ficou guardado, na solidão de um arquivo em um computador.

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  26. Praticamente, só conheci minha avó materna. Mas é só a lembrança impressa numa foto em que estou com ela.
    Hoje me esforço ao máximo para “construir lembranças” para meus bisnetos (Morangos, mirtilos, parque - Bambuzal é o preferido deles) e por aí vai.
    Mas você foi fantástico em homenagear as avós! Obrigada pela parte que me toca.

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  27. Adorei a cronica de hoje, me lembrou uma reportagem que falava sobre uma fusão entre asilos e orfanatos. Parece uma solução perfeita, crianças e idosos dando e recebendo amor e preenchendo o vazio da solidão, mas sabemos que não é facil.

    Por outro lado, no âmbito pessoal, me resgatou memórias maravilhosas da minha avó Eliza... uma avó espetacular que sabia de cor uma infinidade de histórias de cordel, uma mulher simples e tão letrada...muito sábia, uma apaixonada por literatura, devoradora de clássicos nacionais e estrangeiros. Uma mulher muito à frente do seu tempo. Seu saber nos era transmitido em forma de histórias contadas com seu toque especial, tão delicado, tão sereno, tão cheio de valores e princípios.

    Minha avó é a prova viva de que a morte não extingue uma pessoa, ela segue na lembrança, no amor, no afeto, no legado que me acompanha. Ela pode ter saído do meu lado, mas vive em mim.

    Sou muito privilegiada por ter convivido com ela até o dia da sua passagem, sinto muita saudade e gostaria de me tornar uma avó, ao menos, parecida com o que ela foi pra mim... mas não tenho visto motivação em meus filhos em me promoverem a tão elevado cargo.

    Por enquanto estou me animando com a possibilidade de me tornar uma avó de aluguel e, assim, ter a oportunidade de oferecer uns cafunés, contar algumas histórias, ensinar músicas antigas, alguns sábios ditados, dar conselhos, algumas brincadeiras infantis que não usam tecnologia, uns truques de cozinha e costura, fazer picnic, indicar algumas leituras... enfim, transmitir um pouco desse amor que tão generosamente recebi da minha vovó.

    Gratidão por resgatar um sentimento tão agradável para mim.

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  28. Uma bela crônica com uma história que só as avós sabem o que significa.
    Parabéns meu amigo Hayton

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  29. JAILTON TRANCOSO SILVA3 de dezembro de 2025 às 15:31

    Perfeita crônica. Retornei ao tempo de criança para lembrar o quanto importante foi ter convivido com minha avó materna. Ao mesmo fiqueina pensar como serei apartir do próximo ano quando estarei estagiando como Vovô.
    ObrigadonHayton por mais este lindo texto.

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  30. ...Excelente crônica, caro HAYTON! - Quem imaginaria que chegássemos a tal estágio de convivência.
    ...Inimaginável o desfavor que a solidão é capaz de fazer ao ser humano.

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  31. É, parece que o “mundo” está muito determinado a nos mostrar que nosso tempo vai se exaurindo.
    Eu, que convivi apenas com uma avó, e sequer conheci a outra, falecida muito precocemente, sei que não há mágica que as faça ressurgir.
    Mas vamos inventando relações apenas para reafirmar nossas carências.

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  32. Legal Hayton.

    A crônica captura, com precisão, uma verdade que muitos fingem não perceber: estamos tão ocupados em “otimizar” a vida que esquecemos de vivê-la.

    Quando o texto diz que o mundo anda cheio de “órfãos de convivência”, ela não acusa a tecnologia, mas chama a atenção para a falta de presença, essa presença que as avós dominam como ninguém.

    Há uma delicadeza poderosa na imagem da avó que bate à porta sem aviso, trazendo não só uma visita, mas um gesto de cuidado que dispensa confirmações, emojis e recibos de leitura.

    O texto acerta ao lembrar que certas coisas não se digitalizam: o cheiro da sopa que conserta o dia, o carinho que se costura sem pressa, a escuta que não tem pressa de terminar.

    No fundo, a crônica nos provoca a rever prioridades. Não se trata de nostalgia, mas de reconhecer que, enquanto corremos atrás de conexões rápidas, esquecemos das conexões reais, aquelas que não caem quando falta luz. Avós sabem disso instintivamente. E talvez o maior aprendizado seja justamente reaprender com elas a arte de estar junto, sem precisar pedir senha para entrar.

    Raquel de Queiroz tinha razão quando pontuou no texto "A arte de ser Avó:

    "Netos são como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de repente lhe caem do céu... É como dizem os ingleses, um ato de Deus". Sem se passarem as penas do amor, sem os compromissos do matrimônio, sem as dores da maternidade. E não se trata de um filho apenas suposto. O neto é, realmente, o sangue do seu sangue, o filho do filho, mais que filho mesmo..."

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  33. Agostinho Torres da Rocha Filho3 de dezembro de 2025 às 17:48

    O texto nos remete a uma reflexão sobre a vida dos idosos na sociedade moderna. Já ouvi de um colega aposentado do Banco do Brasil a seguinte afirmativa: "Aposentado é como rolete de cana chupado..." Bem assim! De fato, a mesma sociedade que chama o aposentado de peso é a que depois corre para alugá-lo quando percebe que, sem ele, a vida perde o cheiro, o sabor... Parabéns!

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  34. Vou repetir o que imagino que todos sentem, é tão gratificante estar com os netos, que, se sobrasse tempo, pagaria pra ficar com outros.

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  35. Mais uma vez somos levados à reflexão, por conta do cotidiano, que nos arrasta para o abismo da solidão. O isolamento não é privilégio só dos japoneses, mas, em todos os "mundos" está presente. O cafuné da avó ou as brincadeiras de um avô bem humorado, não têm preço. Infelizmente, a "coleira eletrônica" que nos obrigaram a usar, leva-nos à escuridão do canto mais remoto, onde apenas visualizamos, em tamanho "3 x 4", fragmentos do que poderíamos sentir se a conversa ou o afeto fosse presencial.

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  36. Mais uma vez sua crônica nos sacode de forma marcante.
    Elucubrei muito antes de vir aqui, e por vários motivos.
    O primeiro deles, preciso afirmar, e de forma contundente, é minha convicção de que, quem quiser se tornar um babaca autêntico e feliz, seja avô ou avó. Nossa vida se transforma de forma bem forte, como acontece comigo. Sempre fico a matutar; há algum tempo essas figurinhas não existiam, e hoje não consigo mais conceber a vida sem a presença delas - tenho dois netos e uma neta e a relação é rigorosamente de paixão, amor será quando eles crescerem, se eu aínda estiver aqui. Por sorte minha, eles também são apegadíssimos a mim.
    E há um detalhe significativo que me faz convencer da importância dos avós na vida dos netos. É que eu não conheci nenhum avô, nem avó, todos se foram antes de meu nascimento, e sempre tive e continuo tendo forte frustração por isso. E olha que já tenho 77 aninhos, embora ainda muito conservado fisicamente, passo por setenta e seis e meio pra todos que me conhecem...
    Digressões à parte, querido Hayton, sua crônica mais uma vez sacode fortemente a todos nós, seus leitores e admiradores, os comentários aí provam inequivocamente isso.
    Aliás, essa é tão contundente que bastam os dois primeiros parágrafos pra nos levar a forte reflexão. De quebra, ainda tem a ilustração brilhante, determinante e insuperável do genial UMOR, essa figura tão querida por todos que têm, como eu, o privilégio de sua amizade.

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  37. Quem não sofre ou já sofreu solidão, lembra de uma vida passada em convivência intensa diária e, de um momento para outro, se vê sozinho? O mercado está aí para suprir a demanda. Seria uma espécie de cuidadora: companhia, boas conversas, cafuné, cuidados higiênicos, sei lá, o mundo e as pessoas estão cada vez mais agindo com novo comportamento. Se uma avó, uma boneca inflável, vai amenizar a solidão, é um aspecto particular de cada pessoa. Portanto, Sr. Hayton, me sinto um inapto para tecer comentários satisfatórios para o texto.

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  38. Tenho certeza que eu conheço aquela que chama pelo apelido de infância, enquanto faz um cafuné. Não tive esta ventura, quando criança, mas meus filhos tiveram, dividindo com os primos sem concorrência. E meu neto é quem motiva os cafunés de hoje em dia e a vontade de morar por perto!

    Mas, "tenho medo do futuro e da solidão que vai bater, na porta de muita gente".

    Tenho três filhos e somente um neto. É possível inferir, trazendo para a realidade de outras famílias, que, nesse ritmo, o percentual de idosos, no total da população, vai aumentar. E muito! E, junto, também vai aumentar a solidão...

    Parece um caminho sem volta, mas espero que não, embora a esperança seja pequena...

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  39. Marcante!!! que abordagem...
    Me leva a refletir sobre a estrada que já percorri nessa vida.
    Millôr Fernandes falou que os filhos geralmente morrem inadimplentes com os pais. Sempre achei uma grande verdade. Essa Crônica me consolida essa certeza. Devedores de afetos, certamente, nós, filhos, somos.
    Aí vem a história do preço. Afeto não se compra, se conquista.
    - Meu Amigo e admirável Escritor, me permita essa anotação, pois sua especial atenção me alertou para essa coincidência.
    Mas, seguindo avante com o singelo comentário, sinto que vidas prolongadas pela medicina, apenas, é somente sobrevida. Até mesmo parecida com uma UTI, só que, nesse caso, a criatura pode se movimentar para lá, ou para cá, mesmo sem destino, que ficou nos afetos inadimplidos.
    "Influencers da Saudade". Gostei. bem reflexivo e amplo.
    Belíssíma Crônica.
    Abração!!!
    Mário Nelson.

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  40. Maria de Jesus A. Rocha4 de dezembro de 2025 às 19:17

    Belíssima crônica!
    Eu não tive o privilégio de conviver com os meus avós. Eles faleceram eu ainda era criança , além do mais, morava em outra cidade.
    Na minha infância, adotei uma vizinha como avó ( Vovó Alzira).
    Ela me ensinou muitas coisas,( costurar, bordar, cozinhar e me levava para passear, etc ...)
    Feliz aquele (a) que teve cafune e ensinamentos dos avós.

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  41. Vida louca vida
    Vida breve
    Já que eu não posso te levar
    Quero que você me leve

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  42. Amigo Hayton, sempre um presente para nossa reflexão, para o exercício da vida que queremos dar e ter. Acompanhado, da qualidade e envolvimento dos seus textos. Vamos que vamooooos!
    Quem viver, verá.

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  43. Como diz a música, sem amor ninguém vive, não, sem carinho a vida é má... imaginemos como será daqui a 30 anos... As avós serão da geração z. Só duas pra dizer. Os problemas de solidão serão bem piores. Torçamos.

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  44. Você tá certo em lembrar que daqui a pouco seremos nós. A coisa não vem em ordem alfabética nem geográfica, mas na ordem econômica. Só agora estamos vivendo a falta de trabalhadores na economia. Assim sendo, vão ser comprados os cafunés das avós que hoje nem imaginam

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  45. Emílio Hiroshi Moriya10 de dezembro de 2025 às 05:43

    Kodokushi: mais uma palavra e significado que veio do outro lado do mundo e explorado pelo pesquisador Hayton, que aprendi.

    É bem capaz de espalhar pelo mundo essa ideia "maluca" de alugar vovós!
    Será que já existe em modo virtual?
    A solidão é terrível em qualquer lugar.
    Parabéns pela bela reflexão!

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