O tal do VAR (do inglês: Video Assistant Referee) anda deixando o futebol cada vez mais sem graça, insosso, morno. VAR, para quem não sabe, é um assessor de luxo que analisa comendo pipocas as decisões tomadas pelo árbitro principal de uma partida de futebol com o uso de imagens de vídeo. Ainda não faz parte das regras do jogo, mas, daqui a pouco a sua incorporação deverá ser julgada pela International Football Association Board.
Andei vendo alguns jogos do Brasileirão e da Copa América e penso que a fogueira que sempre aqueceu o futebol tende a virar cinzas com o anticlímax proporcionado pelo VAR. Em tese, a tecnologia aplicada deveria ser em benefício do próprio esporte, como é no vôlei, automobilismo, natação, tênis por exemplo. Não é. Emoção e razão são água e azeite: não se misturam de jeito nenhum, pelo menos em algo que, antes de tudo, é adrenalina pura.
Mesmo o vascaíno, acostumado com arbitragens esquisitas — tanto quando seu time enfrenta Flamengo ou Corinthians, como ao ser beneficiado em pênaltis marotos ao atuar em São Januário —, nota que o futebol anda perdendo a graça quando um joelho ou um pé à frente determina impedimento e invalida um gol, frustrando não só a torcida que acabara de urrar pela desgraça do adversário, como também o atleta em seu esforço para bem executar sua arte.
É duro ver o árbitro, por cinco ou seis minutos — que nunca são totalmente acrescentados antes do final do jogo — depois do lance que validara a olho nu, voltar atrás e recomeçar a partida como se nada tivesse acontecido, desgastando a todos, inclusive os torcedores no estádio ou pela TV, que não sabem se vibram ou sofrem com o mesmo lance.
Determinados eventos — se é que vocês me entendem — não resistem a tanto tempo de paralisação nem quando os envolvidos ainda estão cheios de hormônios. O sangue esfria. Pior que os atletas e os treinadores já se deram conta que, em qualquer lance duvidoso, podem cobrar o uso do VAR. Pressionam dentro e fora do campo e o árbitro acaba mais perdido do que surdo em bingo de cartela cara.
E quem garante que um árbitro principal com interesses inconfessáveis vai aceitar o alerta da mesa do VAR se “seu” time correr o risco de ser prejudicado numa análise mais detalhada de um lance? É só fingir que nada escutou e sacolejar as mãos no típico “segue o jogo” que fica tudo por isso mesmo. Ou, se quiser manter o resultado parcial de uma partida, basta paralisá-la com várias simulações de auscultas ao VAR.
Basta conferir se a bola entrou ou não, em caso de gol. No mais, é evidente que se insistirem nisso, o nível de sofisticação do sistema tecnológico irá evoluir tanto que daqui a pouco um beiço de pulga ou um cabelo de sapo poderá deflagrar a terceira e definitiva guerra mundial a partir de um estádio de futebol. Ficará mais perigoso do que barbeiro com soluço.
É preferível tolerar aquela discussão interminável das noites de domingo e segunda-feira, onde analistas passam horas discutindo sobre as possíveis alternativas para um passado cuja versão final o árbitro já bateu o martelo no calor da disputa e no sopro do apito.
Do jeito que as coisas andam, acabarão nos roubando até o direito de sentir-se injustiçado ou de terceirizar a culpa pelos nossos fracassos. Aí o futebol só terá graça naqueles últimos campinhos de terra batida onde a emoção goleia a razão, os times são escolhidos no “par-ou-ímpar”, não precisa de árbitro, bola “prensada” e da defesa, falta só se houver escoriações generalizadas ou se falar na mãe e ganha quem fizer o último gol antes do anoitecer.