quarta-feira, 24 de junho de 2020

Bala de prata

Mal aprendem a falar, as crianças de hoje já sabem o que é Aedes aegypti, o mosquito responsável pela transmissão de dengue, zika e chikungunya, muito parecido com a velha muriçoca (pernilongo), mas com algumas características que ajudam a ser diferenciado dos outros.

A muriçoca de ontem era bem menos traiçoeira do que o Aedes aegypti. Infernizava do mesmo jeito com picaduras e zumbidos, mas nada que mosquiteiro sem grandes rasgos, espiral verde Sentinela ou borrifadas de Detefon não resolvesse o problema. 

Aliás, criado para dizimar os mosquitos da face da Terra, o spray daquele inseticida clássico combatia até “a malária, a febre amarela e o tifo”, segundo uma campanha publicitária veiculada em 1953, em O Cruzeiro, revista semanal que circulou por aqui durante anos. 

Com slogans como “terrível contra os insetos”, “defenda sua casa” e promessas de “proteção prolongada”, exterminava ratos, baratas, moscas, mosquitos e formigas. O duro é que uma certa substância integrante de sua fórmula foi banida em vários países nos anos 70 por contaminar alimentos e intoxicar seres humanos. 

Tio Enoch, a quem visitava no final dos anos 90, no Maranhão, um dia me flagrou na sala a bater palmas acima da cabeça, tentando esmagar os primeiros e sedentos pernilongos no fim da tarde:
– Não conte para ninguém o que vou lhe dizer... – disse ele, olhando para os lados – Eu descobri um método natural para acabar com muriçocas.
– É mesmo, tio? Como é que faz? 
– Você sabe o que é tabaco?
– Será que é o que tô pensando?
– Bom, seu saliente, não sei o que você tá pensando, mas tô me referindo ao pó-de-rapé.
– Claro, tio, foi nele mesmo que pensei. Não é aquele pozinho cheiroso que os velhos tomam uns porres para espirrar? Dizem que é bom para enxaqueca, sinusite...
– Isso! 

Comentei, então, haver lido sobre receitas amazônicas para o tabaco que apresentavam em seu composto, além de fumo, ervas como casca da copaíba, cumaru-de-cheiro (casca da cerejeira), canela-de-velho, pau-pereira, entre outras cinzas de cascas de árvores também medicinais. Alguns índios até hoje acreditam que aspirando o pó absorvem a energia dos espíritos que acompanham o pajé de sua tribo e os espíritos que habitam a floresta. 

Ele me ouviu com o semblante sério, dando a entender que tinha pleno conhecimento de tudo: 
– Vai precisar de alguns seixos, aqueles pedregulhos arredondados de beira de rio.
– Só serve se forem eles?
– Não. Se não conseguir, não tem problema. Pega um martelo e quebra um bloco daqueles de calçamento de rua.

A curiosidade era tanta que corri atrás dos ingredientes da receita e em menos de meia hora, antes de escurecer, estava de volta. Meu tio então me explicou, de forma bastante didática, que deveria espalhar as pedras pelos cômodos da casa e colocar uma pitada de pó sobre cada uma delas. 
Mais tarde, segundo ele, quando vissem a novidade no ambiente, as muriçocas não resistiriam à tentação e dariam boas cafungadas, o que provocaria êxtase e espirros catárticos. Com isso, bateriam a cabeça nos seixos e cairiam duras, mortas por traumatismo craniano ou concussão cerebral.

Olhei para ele e quis fazer aquilo que você faria comigo se eu estivesse agora a seu lado, mas não tive coragem. Havia muito carinho e respeito entre nós. Optei então por disseminar a receita entre amigos e amigas e até hoje ainda encontro quem perca alguns minutos prestando atenção no que digo. 

Meu receio é alguém espalhar essa receita nas redes sociais como a panaceia para neutralizar o surto do novo coronavírus. Vai que o síndico do edifício Terra Brasilis acredita e resolve convencer parte dos moradores da eficácia do método, mesmo sem qualquer validação científica. 

Nunca se sabe de onde virá a próxima bala de prata da indústria farmacêutica nesse tiroteio de soluções para a pandemia que mudou a vida das pessoas de Wuhan, na China, a Inhapi, em Alagoas.

quarta-feira, 17 de junho de 2020

Sonho e ousadia

O menino passava horas observando a sombra de uma varinha enfiada no chão do quintal, a mudar de posição a cada instante, até o pôr-do-sol: 
— O que cê faz aí, hein? 
— Tô vendo o tempo passar, mãe...
No terreiro, além da cerca de avelós, do pé-de-manga e do galinheiro, havia o areal onde ele brincava com a irmã, inclusive nas noites de lua cheia, até ouvirem o chamado da mãe:
— Tá na hora de lavar os pés e beber água pra dormir! 

Chico e Gracita, 7 e 8 anos, últimos dos sete filhos de Januário e Mariquinha, nasceram no sítio Muriqui, à margem do riacho Jundiá, distante seis léguas da cidade de Pedregulho. O sustento da família vinha da pesca, da criação de umas poucas cabeças de gado e do plantio de mandioca, milho e feijão.

Pais e filhos nunca haviam pisado numa escola. Nem desconfiavam de que nossos antepassados já conheciam as horas do dia muito antes de o relógio ser inventado no século 14. 

Sim, por volta de 5.000 a.C., os babilônios descobriram que em certo momento do dia não havia sombra no chão, o que chamaram de meio-dia. Daí dividiram a trajetória da sombra em 12 partes: seis antes do meio-dia (manhã) e seis, depois (tarde). Inventaram o relógio de sol que Chico recriaria no quintal de casa.

Um impulso misterioso leva algumas mães que vivem na zona rural a, de uma hora para outra, querer mudar para cidades maiores, na esperança de que os filhos descubram o mundo, aprendam a ler, a fazer contas, a se libertar da escuridão e experimentar sensações diferentes.

Foi assim que Mariquinha, no final dos anos 50, surpreendeu o marido com uma decisão de bate-pronto, inesperada: 
— Januário, nem pense que vou deixar esse menino ser criado aqui como Deus criou batatas, feito os mais velhos. Nem ele nem a irmã dele.
— Oxente, cê tá ficando doida, é? O que é isso?
— Se quiser ficar, fique, mas vou levar os dois pra estudar em Pedregulho.
— E vão viver de quê?
— Não sei... A gente dá um jeito.

A contragosto do marido, que permaneceu no Muriqui na companhia do primogênito, Mariquinha partiu no fim do mês carregando consigo, além dos filhos mais novos, sonho e ousadia. 

Ao chegar em Pedregulho, cuidou de alugar uma pequena casa na periferia e de arranjar emprego para os três filhos mais velhos, agora os principais responsáveis pelo sustento da família. Resolveu também que Chico e Gracita seriam alfabetizados a partir do começo do ano letivo.

As crianças teriam aulas o dia todo na escola profissionalizante Lar de São Judas Tadeu, sendo a tarde reservada para o aprendizado de um ofício: alfaiataria, bordado, carpintaria, costura, serralharia. Gracita não se animou muito, mas Chico ainda pensou em se tornar alfaiate para cortar aquelas roupas alinhadas que os mais abastados ostentavam na igreja.

Determinados a retribuir o esforço feito pela mãe e pelos irmãos mais velhos, durante todo o ano letivo os dois irmãos alcançaram os primeiros lugares nas avaliações  mensais. Por isso, Chico foi escolhido orador da turma para a festa de formatura. Gracita, integrante do coral que se apresentaria na cerimônia, de última hora foi substituída pela filha de um político local sem que a professora lhe desse uma explicação razoável para o fato.

Ela chorou dois dias e duas noites em seu quarto, escondida da mãe. A professora buscou contornar dizendo que lhe faria “declamadora” porque falava alto. E lhe ensinaria um poema, a ser recitado no palco.

Gracita engoliu sem mastigar a frustração mas decorou o texto, versando sobre as dificuldades de uma órfã num mundo hostil do pós-guerra. No dia do evento, com a mãe toda orgulhosa e perfumada na primeira fila da plateia, a filha declamou de forma tão intensa que comoveu a todos. Talvez ainda amargasse o travo na garganta por não ter sido possível realizar o sonho, acalentado durante meses, de cantar no coral. 

No auditório, inquieta sem saber o que ocorria com a filha, que continuava a declamar cada verso de forma enfática, com olhos úmidos e punhos cerrados, Mariquinha levantou-se e gritou: 
— Chore não, minha filha, cê tem mãe viva. Chegue pra cá... Óia eu aqui, bem na sua frente!

Padre Ariano, diretor da escola, quase caiu da cadeira, mas logo prestou os esclarecimentos à mãe aflita. Padre, aliás, que tinha um carinho todo especial por Chico, o orador que agora subia ao palco para proferir seu discurso e para quem o diretor, com suas mãos brancas, enormes e peludas, preparara um texto que começava assim: “O tempo pode ser medido pelas batidas de um relógio ou pode ser medido pelas batidas do coração...” E fechava inspirado no poema “O trabalho”, de Bilac: 
“(...) É preciso trabalhar.
Não nasce a planta perfeita
E nem nasce o fruto maduro
Para se ter a colheita
É preciso semear (...)”

Para quem assistiu à cerimônia, estava nascendo em Pedregulho uma grande atriz, como Bibi Ferreira e Fernanda Montenegro, capaz de, mais adiante, ganhar o Oscar, da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos. 

Nascia também, no espírito investigativo e obstinado de Chico, quem sabe um futuro cientista ou escritor de renome na vanguarda intelectual do País. Mal aprendera a ler e já devorava os livros de Monteiro Lobato, fascinado com as artes de Emília, uma boneca de pano com sentimentos e ideias libertárias, e do Visconde de Sabugosa, um sábio sabugo de milho com atitudes e manias de gente grande.

Mariquinha levitava àquela altura. Tanto mais porque seu velho Januário, morto de saudade, já se desfazia do pequeno patrimônio rural e voltaria a juntar a família no Ano Novo. Justamente quando da transição do Brasil antigo para o Brasil moderno, de acordo com Joaquim Ferreira dos Santos, no livro Feliz 1958 - o ano que não devia terminar.

O relógio do tempo foi ligeiro. Chico e Gracita, hoje aposentados e vizinhos de porta na Capital — reclusos, à espera da vacina para o mal que travou o mundo que ora se reseta —, até conseguiram chegar à universidade, mas não seguiram em frente. 

Gracita casou com um comerciante, virou dona-de-casa e tem três filhos, que lhe deram seis netos. Chico também casou, tem dois filhos e quatro netos, mas foi além e "pulou a cerca": manteve uma relação por mais de 30 anos com uma instituição pública — às vezes, jazigo de sonhos — que lhe remunerava bem e em dia, garantindo-lhe uma vida sem sustos.

Passarinho em gaiola limpa pode ter alpiste, painço, água e passador, até cantar bonito, mas não aprende a voar. 

O menino agora passa horas contando as batidas de um antigo relógio alemão Schwarzwald na parede da sala de casa, ao lado de uma gravura em bico-de-pena de Clarice Lispector onde se lê no rodapé: "O que nos impede na maioria das vezes de ter o que queremos, de ser o que sonhamos, de fazer o que pensamos e aceitar com o coração é a ousadia que não cultivamos".

quarta-feira, 10 de junho de 2020

Sim, hoje é sábado

Sim, hoje é sábado. Só por isso ainda sinto o cheiro de cera do chão das casas em que morei quando menino, a ver meu pai circulando entre salas e quartos, fazendo brilhar o cimento queimado e os mosaicos, a ouvir boleros do Trio Irakitan.

Vem à cabeça também o “gol da lua” nos campos enlameados de minha meninice. Na boca da noite, racha no zero-a-zero ou com vitória parcial por apenas um gol de diferença, alguém gritava: “quem fizer primeiro, ganha!”. Era um salve-se quem puder, um deus-nos-acuda sem sentido.

Lembro do trajeto de casa até o altar da capela do Convento Bom Pastor, no último sábado de 1976, ponto de partida de uma viagem sem volta nem fita de chegada rumo à Terra Prometida. Éramos dois sem parentes importantes nem dinheiro no banco, mas estava escrito nas estrelas que teríamos um só coração, bem repartido entre a esperança e a razão.

Ouço como se fosse agora mesmo o grito familiar a convocar à mesa da cozinha caras e bocas espalhadas pelos quatro cantos da velha casa. Filhos, noras, genros e netos davam conta em minutos do panelão de galinha guisada com purê de batatas (suando manteiga!), arroz, feijão verde e farofa. Nem lavavam as mãos, imagino.

Sim, hoje é sábado. Só por isso me transporto à Bahia de todos os cantos do começo dos anos 90, quando acordava cedo aos sábados pelo simples prazer de flanar entre os quiosques do mercado do Rio Vermelho, apalpando frutas, legumes e verduras. Voltava para casa ouvindo no toca-fitas mais um canto que surgia na cidade: 

“(...) A cor dessa cidade sou eu 
O canto dessa cidade é meu (...)”

Vem à cabeça também o retorno para Alagoas pouco tempo depois. Irmãos feito galos de briga na rinha de vôlei do quintal de Zé e Zu, na praia de Ipioca. Revejo todos eles na mesa de baralho, noite adentro, entre tragos e goles, a ouvir Nat King Cole amaciando a madrugada:
“(...) Cachito, cachito, cachito mio
Pedazo de cielo que Dios me dio (...)”

E como esquecer dos sábados na praia de Enseada de Corais (apesar dos ouriços-do-mar!), no Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco? Ou do jorro da bica de Sete Casuarinas, no que resta de Mata Atlântica na Estrada de Aldeia, onde as árvores dançam e cochicham entre si ao entardecer? 

Ouço ainda como se fosse agorinha, apesar de avesso à mistura insalubre de barulho, calor e multidão, a apaixonada confissão do menestrel de São Bento do Una, Alceu Valença, nos sábados em que o Galo da Madrugada acordava a cidade:
“(...) Voltei, Recife!
Foi a saudade que me trouxe pelo braço (...)” 

E como recordo do primeiro sábado, no Planalto Central, em que já não mais teria que retornar ao trabalho na semana seguinte. Devagarinho, ficaria nítido para mim que existem duas fases na vida, infância e aposentadoria, em que a felicidade pode estar na tela de um tablet (ou na ponta de um lápis sobre uma folha de papel em branco) onde quase tudo é possível.  

Claro, bem mais recente, lembro também dos sábados no “Quintas do Sol" ou “Porto Gurguéia”, nos arredores de Brasília, onde podia sentar com amigos e costurar retalhos do tecido de nossas vidas. O ensopado de carneiro ou o bacalhau ditava o tempero da prosa e o balanço da rede na varanda nos embalava de graça até o pôr-do-sol.

Sim, hoje é sábado. Só que chove lá fora, o dia está escuro, cheio de mistérios. E não tem graça alguma saber que na esquina um inimigo traiçoeiro ainda me obriga a ficar em casa. Nem vale a pena me fazer de valente, tentar encará-lo e a festa acabar antes da hora, sem direito nem mesmo à decência de um adeus.
   
Deve ser por isso que acordei mal-humorado e me pego aqui a puxar pela memória pedaços de sábados que ainda mexem dentro de mim, numa esperança doida de que essa chuva passe logo e o sol reapareça com toda a força, antes que eu me esqueça de tudo.

Não, o sábado não é uma ilusão, como disse Nélson Rodrigues um dia.

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Que safadeza é essa?!

Em tempos de reuniões ministeriais cujo palavreado deixaria constrangida a inesquecível atriz Dercy Gonçalves (1907 — 2008), lembrei-me de duas repreensões que recebi por usar termos inaceitáveis para meu pai: sacanagem e merda, vejam só!

Um dia, chateado com um de meus irmãos por conta de uma bobagem qualquer, reclamei: “isso é sacanagem sua!” Meu pai ouviu, me olhou firme e foi direto ao ponto: “nunca mais diga isso, entendeu?” Noutra, apenas repeti o que já ouvira na rua ao criticar um vizinho: “olhe a merda que você fez!” De novo, ele chegou junto e decretou: “se falar isso outra vez, vai apanhar!”.

Lá em casa, sob pena de puxão de orelhas ou croque no cocuruto, o máximo admissível em termos correlatos a palavrões (ou “nomes feios”, no dizer dele) eram: cocô, bunda, pinta, pássaro, “piupiu” ou, no limite, safadeza. E não é bom nem pensar no que aconteceria se um dos filhos de Seu Agostinho pronunciasse um um robusto “taquiupariu!”

Talvez por isso nunca aceitei ser classificado por alguém pelo ultrajante “você é um merda!”. E até hoje não sei o que uma pessoa que achincalha outra dessa forma tem fora da cabeça, porque dentro, eu sei. E não cheira nada bem.

Quando cresci, claro, o repertório de vocábulos impróprios engrossou o caldo, mas só afloravam em situações especiais e em doses terapêuticas, quando era vítima de insulto, ofensa, pisão, queda ou topada. E quando meu time sofria um gol ou perdia um daqueles imperdoáveis. Apenas compreensivas interjeições, diriam meus colegas de verbos e verbas Marcelo Torres e Silas Braga Jr.

Fiz o que pude para não usar palavras peludas de grosso calibre no trabalho e ferir o decoro do ambiente profissional, mas confesso que não foi nada fácil. Evoluí ao conviver com pessoas sensatas que nunca recorriam a termos chulos para se expressarem e minhas recaídas andam cada vez mais raras depois que me aposentei. 

Semana passada, ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, o seu titular disse algumas palavras que me lembraram meu pai: “...A falta de educação produz vidas menos iluminadas, trabalhadores menos produtivos e um número limitado de pessoas capazes de pensar criativamente um país melhor e maior... A educação, mais que tudo, não pode ser capturada pela mediocridade, pela grosseria e por visões pré-iluministas do mundo”. 

O discurso também me remeteu a um episódio que me contaram há muito tempo. Teria ocorrido nos anos 90, envolvendo um ex-presidente do Banco do Brasil. Ao noticiar a nomeação de um diretor, o chefão lhe rasgava elogios numa reunião quando um dos presentes, em tom de pilhéria, comentou baixinho: "dá a ele..." 

Boca-suja incorrigível, o ex-dirigente ouviu e retrucou em cima do laço: "eu como você e ele, seu filho da...". A gargalhada de alguns pode ter desanuviado o ambiente, mas não escondeu o fato de que o estofo da cadeira presidencial era bem maior do que a bunda do ocupante de plantão. 


O mundo corporativo anda repleto de exemplos dessa natureza. É a partir da vulgaridade das relações internas entre seus líderes que grandes empresas perdem o respeito da sociedade. Mais que isso, quando esses líderes, fora das quatro paredes, se acovardam diante de ofensas à instituição que deveriam defender, ela vira manteigueira de pensão de beira de estrada, onde todos metem as mãos e se lambuzam à vontade.

Voltando à reunião ministerial que deve ter enrubescido Dercy Gonçalves, um certo participante — ilustre anônimo até pouco tempo e já despontando para o escrete das mediocridades históricas — não foi claro ao explicar seus objetivos. Disse ele: “O BNDES e a Caixa, que são nossos, a gente faz o que quer. Banco do Brasil a gente não consegue. Então, tem que vender essa porra logo!” 

Perdão, meu pai, mas tenho que perguntar a meus leitores: que safadeza (sacanagem ou merda) é essa?! O que ele quis dizer mesmo com “a gente faz o que quer"? A quem interessa concentrar ainda mais o mercado bancário? A que preço cogita vender a “jóia da Coroa” em meio à grave crise sanitária, política e econômica em que chafurda o País?

Certos palavrões são ditos apenas para esconder nas entrelinhas — com o rabo de fora, claro!  coisas bem mais feias que nos deixam de orelhas em pé.