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Mostrando postagens de abril, 2021

Na forma da lei

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Nos primeiros meses de mandato, o síndico foi logo alertando que uma das vagas  que teria que preencher, na garagem do suntuoso prédio da Corte Suprema,  está reservada a alguém “terrivelmente evangélico” (seja lá o que isso queira dizer!). E arrematou, para deleite de uma claque de bajuladores: “A caneta  Bic  é minha, mando porque posso e vai obedecer quem tiver juízo”.    Um dos candidatos à vaga é tido como alguém de notável saber jurídico,  apolítico, incorruptível , inflexível, além de assustadoramente cristão .   Tem, por isso mesmo, expectativas em relação ao topo da hierarquia do Poder Judiciário.   "Duvido que não tenha ponto fraco. Todo homem tem seu preço! Ninguém é santo..." – comentaria Armando Rollo com um amigo, por coincidência assessor daquele candidato, tal era o conceito que tinha dos seres humanos em geral e das autoridades, em particular.   "Sei não... Se tem, só Deus sabe! O homem não bebe nem guaraná, não fuma, não fala palavrão, não cobiça a mulh

Quem pirou o pirarucu?

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No fim do mês passado, um pirarucu daqueles da Bacia Amazônica,  tido como um dos maiores predadores de água doce em temperaturas que variam de 24°C a 37°C  –   pode chegar a 330 kg, medindo mais de três  metros  – ,  foi visto agonizando na beira de um rio no parque  Cape Coral’s Jaycee , na Flórida, nos Estados Unidos. O fato sem precedentes se compara ao príncipe Charles, passeando com Camila, a duquesa da  Cornualha , nos jardins do  Palácio de Buckingham, flagrar uma reunião   envolvendo um bicho-preguiça, um macaco-prego, uma capivara e um tatu-bola, a chuparem bacias de jabuticabas, pitangas e pitombas, sob o olhar protetor de uma onça-pintada  – retrato  de paz na terra entre bichos de boa vontade, debaixo dos chuviscos de março fechando o inverno.   Claro que os americanos entraram em pânico com o nosso pirarucu. Tanto que pediram aos cidadãos que, se toparem com outro exemplar, fotografem ou filmem e mandem a imagem. Mas por que o desespero? Temem que possa ser o começo de um

Como vai você?

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Como vai você? Preciso saber de sua vida. Praticamente já se disse tudo sobre você, de bem e de mal, mas ninguém lhe pode negar que ainda canta sem aspas, ama sem interrogações, sonha com reticências e vive sem pontos de exclamação. E nunca se deixou abater pelas tragédias que sacudiram a sua vida, tampouco as dores que em algum momento podem tê-lo feito pensar em desistir.    Você nunca foi de desistir. Aos seis anos, por exemplo, a história poderia ter tomado outro rumo enquanto você brincava perto da estação ferroviária e parte da sua perna teve que ser amputada. Restou-lhe usar muletas, depois uma perna mecânica cuja existência o faz mancar ligeiramente até hoje. Nem mesmo o mal que lhe roubou sem piedade três bem-amadas amantes (Nice, Rita e Ana Paula) conseguiu murchar as flores do jardim de sua casa.   Aos 13 anos, você deixou Cachoeiro de Itapemirim, interior do Espírito Santo, e foi morar com a tia Dindinha, em Niterói, onde estudaria e tentaria lançar-se como cantor em progra

O espelho

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O menino não tardou a perceber que as palavras impressas nos livros tinham o poder de guardar histórias, emoções e personagens. Aprendeu a escrever movido pela curiosidade de ler desde rótulos de latas até letreiros de rua. Mais tarde, por necessidade profissional, descobriu que aquilo seria caminho, vinho, vício desde o início.   Um dia, cresceu e se deu conta de que tudo o que construiu na vida estava ligado à palavra escrita. Dessa relação de amor e amizade nasceram cartas, memorandos, relatórios, pareceres, notas técnicas e, mais recentemente, crônicas – desde pequenas confissões até poemas em prosa ou reflexões sobre as miudezas da hora.    Velho amigo dele, vejo que o menino de ontem, hoje surfando num oceano de histórias vividas, possui agora outros olhos, outros ouvidos e, por assim dizer, outro modo de falar e escrever. Um jeito novo de enxergar o mundo, inclusive o universo empresarial.   A crítica que ele fez outro dia a um texto que circulou entre os funcionários da firma e

Jogo de interesses

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“Velho é o mar, ainda assim continua cheio de onda”, dizia um pescador sessentão que conheci no final dos anos 70, na Balança de Peixe  do bairro de Jaraguá, em Maceió, quando me contava de seu interesse em adquirir um motor de popa e seguir adiante no ofício. De tardezinha, voltava sempre com o barco carregado de bijupirás, ciobas, curimãs, guaiubas e sirigados. Nunca atrasou uma prestação sequer. Hoje, com a mesma idade dele à época, também não encaro a velhice como uma doença incapacitante, como algumas pessoas que conheço. Se muito, um tipo de reação alérgica, isto é, a forma pela qual cada um reage à perda de identidade social depois que deixa de trabalhar ao lado de outras pessoas ou à sensação de proximidade do fim do baile da tarde. Reação também à pré-falência de múltiplos órgãos, não por causa de uma moléstia qualquer, mas pelo mal do Dodginho Polara  (a "meninada" dos anos 70 sabe do que estou falando): um problema atrás de outro, fruto da infeliz combinação de mot