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Mostrando postagens de janeiro, 2019

Versões de nós mesmos

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Toda quarta-feira eu e meu irmão Agostinho (Nena, para mim, porque quando nasceu eu não sabia pronunciar “nenê”) íamos ao mercado público do Parque Rio Branco, em Maceió, comprar carne, frutas e verduras, ali no início dos anos 70. Saíamos de casa ansiosos nem tanto pelos 6 km que separavam a Gruta de Lourdes - bairro onde morávamos - da feira livre na Levada, mas porque a revista “Placar”, para nós a revista mais importante daquela época, chegava às bancas justamente às quartas-feiras.  Teríamos que subtrair do dinheiro da feira alguns trocados para comprá-la e devorar cada página, da capa à contracapa, muitas vezes ainda no ônibus que nos levaria de volta para casa. Nossa mãe, apesar do orçamento apertado - éramos nove filhos, sete em idade escolar - nunca percebeu a malandragem, mas nosso pai, tenho certeza, fazia vista grossa,  tão interessado quanto nós na leitura. Até hoje o cheiro de tinta que saía da revista permanece intacto dentro de nós como um perfume caro. Semp

Bolacha de Leite de Mãe de Jacaré

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Nos anos 60, pelo menos uma vez por ano, papai, eu e meus irmãos esperávamos na plataforma da estação ferroviária de Patos (PB) o facho de luz e o apito do trem que traria nossa avó materna – mãe, para diferenciar de mamãe e porque nunca gostou de ser chamada de vovó – para ficar conosco algumas semanas no Sertão, longe do Sítio Jacaré, onde morava às margens do Rio Paraíba, na zona rural de Pilar (PB). Vinha como de costume, com o coração dividido entre matar as saudades da filha e dos netos e deixar em casa seu primo e marido, nosso avô, que não arredava o pé do chão onde nascera por nada nesse mundo. Sofria também por ter que largar por alguns dias o tititi com que distribuía milho para galinhas e pintos em seu quintal. Como não podia nos oferecer presentes caros, trazia sempre uma sacola com algumas broas escuras e cheirosas, embrulhadas em papel grosso, a que dava nome de “bolacha de leite”. Ela nunca concordou com os nomes pelos quais aquela iguaria que levava para se

Capita... para sempre!

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Aos 12 anos, diante da TV em preto-e-branco, vendo a final da Copa do Mundo 1970, na Rua da Vitória, bairro da Levada, em Maceió(AL), eu não sonhava ser Pelé, Tostão ou Jairzinho. Queria mesmo é ser Carlos Alberto Torres, habilidoso, clássico, que sabia como ninguém retomar a bola dos adversários e sair jogando com elegância, e que beijou e levantou a Taça Jules Rimet após o chute fulminante com que fechara os 4x1 contra a Itália. Se nunca consegui ser jogador de futebol, restou-me o consolo de, quatro anos depois, iniciar minha carreira profissional como office-boy em um banco. Ainda bem que pude contar esta história, 43 anos depois, ao próprio capitão do tricampeonato mundial, em junho de 2013,  quando o conheci no Estádio Morumbi, em São Pulo, no lançamento do projeto "Brasil... um país, um mundo", exposição itinerante de acervo formado por peças históricas, como camisas usadas em jogos oficiais, troféus, medalhas e chuteiras, que passaria pelas 12 cidades-sede da

Brinquedos

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A gente descobre mais cedo ou mais tarde que o tempo para ser feliz é breve e cada minuto que passa, passou. Aprendi isso cedo, nos dois anos que vivi em União dos Palmares, Zona da Mata alagoana, onde cheguei com meus pais e irmãos, em 1968, aos 10 anos de idade. Não tive todos os brinquedos que sonhei, mas tive bem mais do que precisei, até o dia em que mudamos para Maceió (AL). Brinquei demais, vivi como se não fosse envelhecer. Joguei futebol-de-mesa (botões de casca de coco seco ou de capa de relógio), chimbra (bola-de-gude), finca (espeto de ferro) no chão, bafo de figurinhas repetidas, pião e ponteira. Mas nada me dava mais prazer do que marcar gols pelo “dente-de-leite” do Zumbi Esporte Clube, nas tardes de sábado, e, depois do racha, comprar por dois cruzeiros uma cocada de coco e uma garrafa d’água gelada. Também mergulhei e pesquei cará, jundiá e piaba no Rio Mundaú, “cacei” calango com peteca de forquilha de goiabeira (estilingue), armei alçapão para pegar papa-capim, ga