Quem de vocês nunca viu mãe ou pai pegando a mão de sua cria a dizer e perguntar: “Dedo mindinho, seu vizinho, maior-de-todos, fura-bolo e mata-piolho... Cadê o bolinho que tava aqui?” O riso frouxo de quem pressente cócegas é uma das primeiras e inesquecíveis trocas de amor e afeto entre os envolvidos. Vem de lá, imagino, a aptidão para os múltiplos usos dos dedos, que passam a ser conhecidos pelos respectivos nomes.
No começo deste mês, em Torino, capital da região italiana do Piemonte, Antonio Conte, antigo meio-campista e símbolo da poderosa Juventus dos anos 90, hoje treinador da Internazionale de Milão, foi visto mostrando o "maior de todos" (aquele entre o “seu vizinho” e o “fura-bolo”) para Andrea Agnelli, presidente da Juve, na saída para o vestiário após a semifinal da Copa da Itália.
O gesto de erguer o dedão para outra pessoa tem a ver com costume bastante comum entre macacos. Isso porque, na hora de uma encrenca entre bandos e para marcar território, mostram o pênis para seus oponentes. A adaptação pelo homem, então, foi uma forma mais civilizada e racional de fazer o mesmo gesto de “poder”, só que com o dedo (ainda bem!).
Descobri que um dos primeiros registros escritos sobre essa antiga prática aparece no ano de 423 a.C, quando o grego Aristófanes, dramaturgo e poeta, escreveu a peça As nuvens, onde o personagem Estrepsíades acaba fazendo a comparação, em meio a uma piada, entre o dedo do meio e o pênis. A ofensa, então, migrou da Grécia para Roma, onde passou a ser conhecida como digitus infamis (dedo obsceno).
Mais adiante, ao tentar demonstrar seu desprezo por um político bom de garganta e péssimo de entregas – algo comum no meio –, um intelectual também recorreu ao famoso gesto. Após exibir o dedo médio, ainda esculachou: "Tá aqui pr'ocê, seu feladaputa!" (claro, num linguajar mais chulo, da época).
O fato não aconteceu em debate às vésperas de eleições ou na bancada do telejornal noturno, mas sim no século 4 a.C., em Atenas, quando o filósofo Diógenes disse o que pensava sobre o orador e político Demóstenes. Há dois milênios, portanto, o “maior-de-todos” exibido enquanto os demais dedos são seguros pelo "mata-piolho" foi catalogado pelos historiadores como gesto de insulto e menosprezo.
Os romanos chegaram a criar outra expressão para descrevê-lo: digitus impudicus (dedo indecente). Na obra Epigrammata, do poeta latino Marcial, no século 1 d.C., um personagem que é conhecido por ter boa saúde oferece "o dedo indecente" a seus médicos.
Já os franceses foram inovadores e têm a sua própria saudação fálica. O brás d'honneur (braço da honra) é conhecido entre nós como a tropicalíssima banana. E nem se pode aqui culpar nossos antepassados primatas. O ato consiste em apoiar a mão na dobra do outro braço, mantendo o antebraço livre, ereto, de punho fechado, apontando pro céu.
Se tivesse que escolher entre palavrão e gesto ofensivo, considero a banana – incluído o estalo da palma da mão na dobra do outro braço – algo bem mais robusto e simbólico do que um simples dedão, ainda que pertença ao proctologista de Bagé (RS), parente de certo analista que labutava nos Pampas nos anos 70.
O "maior de todos" ultrapassou barreiras culturais e linguísticas. Para mim, deixou de ser obsceno e não representa o órgão sexual masculino coisa nenhuma. Antes da pandemia, já era visto com naturalidade e graça em tudo que é lugar, de feiras livres a estádios de futebol, passando por shows musicais.
O gesto ganhou sentido bem mais amplo no cotidiano de vários países, inclusive o Brasil. Pode traduzir decepção, desprezo, insatisfação, mágoa, protesto, raiva ou revolta. Não deve ser representado pelo órgão inoperante de alguns machões, sobretudo membros nada viris de um grupo prioritário na ansiosa fila da vacina contra a covid-19. Eu que o diga!
Se você acredita nisso e quer estruturar partido politico, seita ou bloco carnavalesco, atrair defensores para a causa, além de expressar sua mais absoluta indignação com “tudo isso que tá aí” (ou com "tudo aquilo que esteve aí"), talvez esta humilde crônica lhe inspire a criar a logomarca.
Lembre-se: o design deve ser conciso e memorável. Quem sabe escorado em slogan do tipo: “Aqui pra eles, ó!”