Para quem trabalhou por mais de quatro décadas numa mesma empresa — hoje em dia, algo visto como falta de ambição profissional, de coragem ou até comodismo —, não chega a ser tão difícil listar algumas figuras especiais que encontrou pelo caminho. Pensei nisso e logo me veio à cabeça uma dezena delas.
Lembrei da "Arrogante", que sempre fazia questão de encurtar a altura entre a ponta do nariz e a do queixo. Só via os outros de cima para baixo e tinha sempre um sorriso de deboche para qualquer comentário mais simplório numa reunião.
Também recordei da "Bocão". Falava sem parar de si própria (o que já era péssimo) e dos outros (inaceitável). Mesmo porque quem se enfeitiça com o som da própria voz pode até parecer interessante por alguns minutos, mas soa ridículo daqui a pouco e insuportável meia hora depois.
Já "Curiosa" chegava cedo e antes mesmo do “bom dia” cuidava de remexer papéis em minha mesa de trabalho; em seguida, bisbilhotava a tela do computador em busca de alguma coisa, convicta de que fofoca vestida de informação lhe tornaria poderosa.
E o que dizer da "Franca"? Via-se acima do bem e do mal por ser sincera “demais” (sic) e orgulhava-se de falar tudo o que lhe vinha à cabeça despreocupada se machucava ou não aos outros com suas palavras duras e frias.
"Gaveta" empurrava tudo com a barriga para o dia seguinte ou para a próxima semana, sem o menor senso de oportunidade. Não se dava conta de que uma máquina lenta era até tolerável, mas um ser humano, nunca!
E a "Inconveniente" era capaz de interromper pelo menos uma reunião por semana, entrar na sala sem ser convidada, fazer dois ou três comentários fora do contexto, despertar alguma compaixão no começo e, logo depois, rejeição ampla, geral e irrestrita.
Lembrei da "Medrosa", avessa a qualquer novidade porque valorizava o que “sempre deu certo”. Não queria saber de nada que provocasse algum distúrbio em sua insuportável rotina, mas se roía de inveja quando alguém ousava e se dava bem.
Tinha ainda a "Mouca". Muitas vezes não escutava nem aqueles que concordavam com seus argumentos. Esquecia de que mesmo sendo obrigada a filtrar bobagens, se não soubesse ouvir perderia por completo a capacidade de conviver com colegas de trabalho.
"Rígida" era cruel. Não sabia perdoar aos outros nem a si própria pelos erros que cometia, tampouco era capaz de reconhecê-los. Dificilmente aceitava um “não” porque se achava determinada, perseverante. Nem por um minuto se enxergava teimosa ou chata.
Já a "Tediosa" era de morte! Se enxergava a rolha do vinho servido na última ceia, incompreendida e subestimada por todos. Vivia pelos corredores a repetir piadas sem graça, rindo não se sabia de quê.
E havia ainda a "Dissimulada", a "Mentirosa", a "Otimista", a "Pessimista"... Agora é fácil falar sobre elas com alguma pilhéria e a distância crítica que a maturidade permite. Se você me leu até aqui, é provável que tenha reconhecido muita gente que cruzou o seu caminho. Quem sabe até você mesmo, numa circunstancia qualquer.
No palco de minha vida profissional, não posso negar, confesso que também usei essas máscaras. Como qualquer pessoa — exceto as perfeitas, que nunca as encontrei mas devem existir —, era mais uma naquele teatro absurdo e grotesco em que ora nos vestíamos de fantoches ou marionetes, ora de cordéis manipuladores.
Aos amigos e amigas que me aturaram por lealdade e respeito; e mesmo àqueles que me engoliram por conta das cadeiras em que sentei por acaso, confesso que cometi meus pecados e por isso mesmo lhes peço perdão. Peço ainda que rogai por todos nós aos céus — de novo, afora os perfeitos — para que nunca mais necessitemos de máscaras para contracenar, por dinheiro nenhum nesse mundo!
Depois que me aposentei, juro de mãos juntas que trouxe comigo apenas uma máscara que todo dia revejo no espelho, cada vez mais serena e desassombrada, com algumas rugas a lembrar as histórias que conto aqui. Enquanto as cortinas não fecham.