quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Certas perguntas

 “Atenção, tripulação, preparar para o pouso!”. Mais uma vez, acordo com este velho anúncio, vindo da cabine de comando do avião que iniciava a manobra de aterrisagem. 

Volta e meia querem saber de mim como alguém que nasceu na Paraíba, foi criado em Alagoas, morou em Pernambuco e na Bahia, gosta tanto de Brasília. 


Digo que não sei. É o tipo de questionamento que pressupõe que as pessoas costumam se sentir mais felizes quando moram perto do mar, com o benefício da umidade e de alguns espaços associados ao prazer e à preguiça. 


Certas perguntas não devem ser feitas! Sobrevoando Brasília, essa miragem de curvas, retas e mistérios debaixo do céu do Cerrado, volto sem gravata, paletó nem sapatos, para fazer o que mais gosto ultimamente: nada, exceto contar histórias, tateando na nebulosa fronteira entre o testemunho e a fantasia.

 

“Meu Deus, mas que cidade linda!”, cantava Renato Russo em sua épica “Faroeste Caboclo”, quando aqui cheguei pela primeira vez, em 1981, para participar por 100 dias de um curso de aperfeiçoamento profissional. 

 

Fotografia: Dedé Dwight

Daqui de cima, revejo a ponte sobre o Lago Paranoá, ligando o Setor de Clubes ao Pontão do Lago Sul, e me vem à memória a figura risonha e robusta de Luiz Arnaud, que morava por perto e com quem convivi nos primeiros dias de trabalho sete anos mais tarde, em 1988.

 

Certa manhã, numa conversa à toa regada a café com pão de queijo, ele me dizia da preocupação de sua esposa, Valéria:

– Olhe só, Arataca, ela quer saber com quem ando aprendendo este vocabulário de jardineiro – disse, numa óbvia alusão ao palavreado e ao sotaque do novo colega.

– Porra, bicho! Ela não pode ser injusta assim com o coitado do jardineiro, que já ganha uma mixaria e ainda querem que fale como se tivesse nascido com trancelim de ouro! – devolvi, recorrendo à interjeição mais usada pelos nativos das nações de língua portuguesa, a quarta mais falada no mundo. 

 

Ele passava horas contando das descobertas de sua escadinha de filhas: Juju, Bebel e Didi. Falava da casa hipotecada no Lago Sul, onde aos sábados lambia os dedos roliços enquanto preparava a galinhada numa panela de barro. Da loja de vinhos que abrira com um parceiro no ainda despovoado Lago Norte. Do tanto que tudo mudara desde que virou bancário em Conceição do Mato Dentro (MG). 

 

Todo dia, às oito, já folheava os classificados do Correio Braziliense em busca de “achados” (oferta de compra ou venda de veículos, imóveis, linhas telefônicas etc.). E gargalhava lendo anúncios de garotas de programa, que atendiam em quitinetes ou em prédios comerciais com áreas adaptadas ao exercício de uma das mais antigas profissões.

 

Demorou pouco a aprontar comigo, que havia comentado sobre a intenção de adquirir um carro usado. Numa tarde, depois do almoço, ele sumiu por alguns minutos da sala onde trabalhávamos, após colocar furtivamente um bilhete sobre a minha mesa dizendo: “Não quis deixar recado. Pede retorno pelo telefone…”. 

 

Disquei supondo que fosse o dono de um Passat em que eu estava de olho. Tive então que ouvir insultos e ofensas partindo de uma jovem morta de sono que passara a madrugada de terça para quarta-feira trabalhando duro, envolvida de alma e corpo com a inesgotável demanda do submundo parlamentar.

 

Ano e meio depois, retornei para o Nordeste (Porto Calvo, interior de Alagoas). Trocávamos cartas e telefonemas. Não havia e-mails nem videochamadas. Um dia, ele riu quando lhe contei de um rebanho de cabras com chocalhos, salivando, que invadira a sala de visitas de minha casa, atraídas pelos cachos de uvas verdes artificiais que enfeitavam a mesa de centro. 

 

De repente, muda o tom de voz e se queixa:

 – Nem sei por que estou rindo tanto. Se você me encontrar não vai me reconhecer...

– O que houve?!

– Tá difícil... Perdi metade do peso. O Arnaud que você conheceu não existe mais. O tratamento tá acabando comigo.

– Puta que pariu! – gritei, mesmo sem saber ao certo da extensão da doença – Mas você é novo, forte, tem plano de saúde e quatro “meninas” pra cuidar. Vai resistir, sim! 

– Só elas me fazem continuar na briga...

 

A briga não demorou. O nocaute foi inevitável.

 

Quase 10 anos depois, em 2000, voltei a morar em Brasília, mas nunca mais soube do paradeiro de Valéria, Juju, Bebel e Didi. Nem o Google, que surgiria entre nós a partir de 2005, me ajudou.

 

E agora me pego pensativo, revendo Luiz Arnaud a caminho de casa, atravessando aquela ponte sobre o Lago Paranoá. Como teria sido sobreviver por suas "meninas" de lá até aqui? Do que estaríamos rindo agora, numa conversa à toa regada a café com pão de queijo? 

 

Certas perguntas não devem ser feitas nem a mim mesmo. Nunca sei as respostas.

46 comentários:

  1. Ademar Rafael Ferreira13 de dezembro de 2023 às 05:14

    Nós, os ciganos profissionais, temos várias paixões sem esquecer as origens. Comigo essa pergunta é em relação à cidade de Marabá. No meu caso, para não deixar a pergunta sem resposta digo: "É que o rio Tocantins tem mais água que o Pajeú. "

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    1. Meu caso é com Brasília, mesmo. João Pessoa é maravilhosa, mas a saudade do quadradinho está matando.

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  2. Três anos, dez meses e alguns dias depois da última viagem a Brasília, meu voo aterrizava no aeroporto internacional JK, na terça-feira, dia 5, depois que comissárias e comissários haviam preparado o pouso, a pedido do comandante.

    Minha caminhada anterior nas não-ruas da Capital da República acontecera em 17/01/2020, quando meu amigo, ex-bancário engravatado, lançava seu primeiro livro de crônicas.

    E agora, eu voltava ao cerrado para estar presente no lançamento do seu quinto livro.

    Esse evento foi muito importante, mas menos do que a oportunidade de trocar um forte abraço com Hayton e com amigos que eu reencontrei depois de muitos anos.

    Nem parece que enfrentamos uma terrível pandemia no intervalo desses dois eventos.

    O importante é que continuamos a caminhada, mesmo fazendo nada, como disse nosso cronista preferido.

    Foram momentos muito especiais aqueles que aconteceram no Sebinho, no último dia 6.

    Luiz Andreola

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    1. Obrigado, Andreola, por poder abraçá-lo, pelo privilégio de sua presença noutro momento marcante em minha vida. Me vi cercado de pessoas queridas com as quais vivenciei muitos momentos felizes.

      Um livro a cada temporada, desde 2019, tem sido apenas um pretexto para novos reencontros. A pandemia nos roubou três oportunidades, mas passou. Tudo passa, exceto aquilo que precisamos e queremos preservar.

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  3. A nos leva a seguir por ela sem direção marcada, temos todas as direções, sendo uma presença silênciosa, pois a memória apaga tudo,e reativar uma direção vivida é muito belo

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  4. Brasília é essa mistura de sotaques mesmo, carinhosamente adotada como lar por gente de todo canto. E pensar que somente em 2018 a população do DF passou a ser formada majoritariamente por brasilienses aqui nascidos, atualmente 55,5% dos que moram no "quadradinho". Eu mesmo, mineiro, aqui estou há 23 anos, já tendo contribuído com 2 pequenos brasilienses para essa estatística.

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  5. Faltou no início a palavra "vida"

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  6. De fato, fazer carreira profissional exige alma cigana. Também vivi muitas histórias e em muitos lugares, de norte a sul, até mesmo em outros países. Também tive perdas de colegas, algumas trágicas. Mas foram tantas alegrias e tantos amigos. Valeu a pena. Vale a pena. Bosco Torres

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  7. Nessa época a ponte nova ainda era promessa e o Lago Sul ainda era longe e eu tinha acabado de sair do lugar que você foi liderar. Isso é Brasília, que como dizia um amigo poeta, é "bagagem de desilusões, crocodilos e corações". Dedé Dwight

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  8. Lembranças são como ilhas com pontes que construimos para mantê-las acessiveis. Dedé Dwight

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    1. Na mosca, Dedé! Sim, pontes podem ser associadas a metáforas que ligam o passado ao presente, por onde a vida passada volta a passar novamente.

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  9. Brasília cativou mais um, fez mais uma vítima! Também eu tive muita resistência em me mudar para Brasília mas, uma vez aqui, não quis mais sair. Esta cidade tem ou encanto magnético sobre todos nós , apesar de tê-lo também sobre a horda de políticos de má índole. Um privilégio ler sua crônica logo cedo !

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  10. “Céu de Brasília, traço do arquiteto. Gosto tanto dela assim”, como canta Djavan.
    Eu compreendo seu gosto, meu prezado Hayton.
    Gosto muito de Brasília também. Morei por lá no início da década de 80. E já gostei logo daquele lugar, mesmo na condição precária de estudante sem dinheiro.
    Muito tempo depois, voltei a morar lá por mais de 15 anos e me apaixonei de vez.
    Ainda tenho planos de voltar a viver naquela bela cidade, diferente, única.

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  11. Anônimo13 de dezembro de 2023 às 06:38
    O ser humano é de fácil adaptação e se acostuma até com coisas que outras pessoas não consideram tão boas. Mas não sei o que Brasília tem de especial para que pessoas que eu conheço terem se adaptado e gostado dela. Imagino ser essa mistura de gente de todos os lugares que faz “um caldo de culturas” que aproxima pessoas saudosas de suas raízes. Nelza Martins

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  12. Terminei de ler seu texto arrepiada! Sua sensibilidade e capacidade de expressar os sentimentos tem forma e alcance únicos.

    Memórias e histórias em uma cidade onde amigos eram mais família do que a própria família em outras cidades … éramos todos forasteiros…

    Num cenário árido do tortuoso cerrado e de horizonte sem fronteiras, com céus mais lindos a cada dia como o de mais essa foto perfeita do Dedé, nos sentimos sempre em casa e acolhidos.

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  13. E pensar que vim para Brasília no início da década de 80 para servir o exército e que ficaria apenas um ano, neste período construí pontes e mais pontes, filhos, netos, bisnetos e esse sentimento gigano tenho quando, de férias, retorno para Londrina uma linda cidade do Paraná.

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  14. Brasília tem a força da gravidade aumentada, com perdão da expressão, Isac Newton, vim aqui para passar uma chuva, já se vão 45 anos e pouco. Quando trabalhei na Agência Central, era comum nos meses de março, muitos colega pedirem transferências para cidades litorâneas, na maioria no nordeste, encantados com a beleza e alegrias que as festas do período de férias proporcionam, no convívio com familiares e amigos. Durava pouco, não mais que dois anos, muitos estavam de volta.
    Convivi com o Luiz Arnaud, em um trabalho que realizou, numa gerência adjunta da Central, depois conhecia a Valéria, também colega, quando trabalhei na Ag. Pres. da República, onde era cedida.

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  15. Verdade, Hayton, a prática profissional nos fez reconhecer belezas em várias partes. E isso foi bastante enriquecedor para nossas vidas e currículos. Agregados aos lugares houve pessoas. Um punhado grande delas. Outra maravilha. Muitas faces e destinos para relembrar. Passados os tempos, temos a opção de buscar na memória locais, fatos e pessoas marcantes. E despejar em páginas brancas escritos bem concatenados, cujas tramas nada mais são do que relatos verdadeiros da vida bem vivida. Que riqueza!!!
    Roberto Rodrigues

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  16. Que belo relato, com história e memória com as quais muitos nos identificamos!
    Saudades do que vivemos e, também, do que não chegamos a conhecer.

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  17. Não é à toa que o clichê "recordar é viver” não sai de moda, pois a vida é somatório de recordações que fazem de cada um de nós sermos únicos.
    E estamos sempre voltando ao Portão, como canta Roberto Carlos:
    "Eu voltei agora pra ficar
    Porque aqui, aqui é meu lugar
    Eu voltei pras coisas que eu deixei
    Eu voltei"

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  18. Bom dia, caro amigo Hayton!

    Top!

    Brasília realmente tem seus encantos e consegue gerar um efeito lindo e magnético naqueles que realmente conseguem visualizar estas suas características especiais.

    No meu caso, isto foi muito forte, dado que cheguei em Brasília em abril/2002, pensando em passar pouco tempo dado minha conexão com a Bahia, mas tudo mudou pois além das grandes amizades que fortaleceram por aqui, ainda mais como a sua, caro amigo *Hayton*, do meu padrinho-amigo *Geraldo ABC*, do amigo *Josemario* e tantas outras pessoas especiais que tive a honra de me conectar, foi aqui em Brasília que também constitui meu quadradinho, meu cantinho e principalmente estruturei a minha linda família, com a minha amada esposa mineira *Marta* e nossos 2 lindos fihos, *Guilherme (6 anos) e bebê Alexandre (5 meses)* que são 100% Brasilienses, nascidos nesta linda terrinha que tanto nos acolheu e ainda nos acolhe, brincando já se passaram mais de 21 anos…uau

    Obrigado, amigo Hayton, pela linda recordação ! Você é um grande amigo que sempre estará no meu coração.

    Aproveito para lhe desejar um Feliz Natal e um 2024 repleto de muito amor, saúde, realizações e felicidades.

    Abraços e tudo de bom!
    Ulisses e Família

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  19.         A amizade é espontânea. Depende dos encontros que a vida nos proporciona. E ela não termina, quando nos afastamos, seja qual for o motivo. Numa profissão, como a nossa, um dos maiores motivadores desses encontros e desses afastamentos (com amigos de verdade, nunca são desencontros, a não ser acidentais) é a busca e a aceitação das oportunidades profissionais, muitas delas verdadeiras missões, que nos obrigam a, "espontaneamente", mudarmos de cidade em cidade, onde a convivência profissional nos proporciona novas e verdadeiras amizades.
            Mas, se para nós, as consequências dessas mudanças quase sempre são benéficas, porque nossos ambientes de trabalho são muito parecidos, para nossas famílias nem sempre é assim. Os efeitos são controversos, especialmente para nossos filhos, que se vêem num ambiente novo, desconhecido. Muitos se adaptam rapidamente. Mas outros não.
          O primeiro impacto, que senti sobre minha familia, foi quando tomei posse, em Santiago (RS), em 1980. Foi a primeira mudança. Mas a distância para Santa Maria (RS), nossa cidade natal, era pequena e isto amenizava. Podíamos visitar nossos parentes com certa frequência.
           Mas o impacto foi muito maior, quando aceitei meu primeiro desafio profissional, meu primeiro "cargo comissionado" (aliás, não sei o porquê, mas nunca gostei desse nome). Mudamo-nos para uma pequena cidade, chamada Rondon do Pará, e lá tivemos nossa primeira noite de Natal longe de nossos familiares (mesmo quando morávamos em Santiago, nossos natais eram em Santa Maria). De repente, houve um "apagão" e ficamos apenas com as luzes das velas, que estavam presas ao pinheiro e em arranjos sobre a mesa. Um de nossos filhos, que tinha apenas três anos de idade, começou a lacrimejar e eu, "bestamente", sem perceber o que ele estava sentindo, perguntei porque ele estava chorando. A resposta veio pronta e firme: "Não, pai! Não estou chorando. Meus olhos é que estão!".
            A mudança seguinte foi para Brasília, em 1985. Para as crianças, a adaptação (pelo menos pareceu) foi mais fácil, mas para minha esposa foi bem dificil. A "Asa Norte", onde morávamos (na "ponta" - SQN116), era muito diferente da "Asa Sul". Ainda tinham muitos espaços vazios e poucas árvores. O sol castigava muito o solo e havia muita poeira. Brasilia era um tal de "ame-a ou deixe-a".
           Hoje, transformou-se. Tem muito verde, muita árvores. É praticamente um grande "pomar", onde colhemos pitangas, amoras e especialmente mangas. Até a "espada" vai bem, mas a preferida é realmente a manga "rosa". Saímos de sacola na mão, para colher as que caem, no chão (as que não estouram, naturalmente). Fazemos isto, quando viajamos, de Recife para Brasília, para visitar nossos filhos e nosso único neto. E são momentos de completo "relax",
            Voltando a falar de amizade, muitos de nós temos laços muito fortes de amizades verdadeiras, ainda que separados pela distância (o que minimiza um pouco, mas só um pouco, são os Grupos virtuais).
             Mas, o momento mais difícil, é quando acontece a separação inevitável, o nocaute inevitável, que também nos machuca e nos deixa apenas com o gosto "doce-amargo" da saudade. Infelizmente, não cheguei a conhecer Luis Arnoud. Gostaria muito de tê-lo conhecido. Sinto muito!

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    1. Outro dia um velho amigo meu, tentando me agradar, disse que lembrou de mim ao ouvir Mia Couto dizer numa entrevista: "O escritor não é o que escreve bem, mas aquele sujeito que tem histórias e faz o leitor viajar dentro dele. É, de certa forma, um contrabandista de almas".

      Não sou escritor; quando muito, um cronista de miudezas. Mas faz todo sentido o que Mia Couto falou acerca de si mesmo.

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  20. Como muitos, vim morar em Brasília em 1992 por uma oportunidade de ascensão profissional. Tinha certeza que assim que pudesse iria embora daqui.
    Aposentei em 2010, a rigor poderia ir morar onde quisesse. Nunca me passou pela cabeça sair de Brasília.
    Tem coisas que não sei explicar e adoro não sentir necessidade de destrinchar.
    Só sei que tá bão demais ir ficando …

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  21. Estive em Brasília em quatro ocasiões, três delas vinculadas a trabalho. Embora tenha havido tempo para fazer alguns passeios, confesso que não despertou-me desejo de tê-la sempre como opção para outros retornos eventuais. Certamente não tive tempo suficiente para criar esse encanto que já ouvi de várias pessoas, a exemplo da recordação tão bem relatada na crônica ora transcrita e em alguns comentários.

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  22. Calça nova de riscado, paletó de linho branco, que até o mês passado lá no campo ainda era flor, sob meu chapéu quebrado um sorriso ingênuo e franco, de um rapaz novo e encantado, com 20 anos de amor.”
    Passeando uma botina surrada pelo barro vermelho de uma Brasília que me acolhera seis anos antes,ainda me vejo, cabelo ao vento, gente jovem reunida, partindo para o futuro, para uma terra distante, para as incertezas da vida.
    Brasília fez isso por mim, me preparou, torneou, lapidou, me poliu com seu sincretismo, sua heterogeneidade, sua generosidade para com os que ambicionaram ir mais longe.
    Dezenove anos depois, voltei, novamente para seu trampolim de ouro, sua catapulta para o sucesso, sua plataforma de lançamento para o além, para o horizonte sem fim.
    Como gratidão por tudo que recebi, espalhei minhas raizes por aqui, em amplexo permanente à essa terra de leite e mel, vislumbrada por Dom Bosco, e abençoada por Deus.
    Viva Brasília!
    Robertão

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  23. Cada coisa que lembramos não é?
    Lembrei-me agora daquela sua secretária que esfregou as panelas que acabaram de comprar de fundo preto, até ficar no alumínio. Magdala quase ficou doida. Mas rimos muito da coitada. Ainda não conhecia o teflon.Dayse Lanzac

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  24. Disso somos feitos, passado, presente e futuro. No nosso caso, que temos mais passado do que futuro, devemos relembrar e reverenciar as boas memórias.

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  25. Talvez pelas amplitudes de suas ruas, a organização urbana que tanto almejamos aqui no Nordeste, Alagoas então nem se fala, mas que talvez nunca chegaremos a ter. Eu também tenho uma queda por Brasília, mas o meu umbigo foi enterrado na areia da praia. Por isso, meu olhar, sonhar e querer sempre busca o mar.

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  26. Todos que passamos por Brasília sabemos o que aquela cidade faz com nossos corações. Andamos, saímos, voltamos e fomos embora. Fica a magia do lugar.

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  27. Certas perguntas carregam o dom de navegar rumo a eternidade, enquanto outras o de merecer respostas erradas. PARABÉNS por nos iluminar com suas belas crônicas. Renato L. Naegele

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  28. Ah... Brasília... Também tive o prazer de morar nessa terra abençoada por Dom Bosco... São muitas lembranças boas. Também tenho uma filha brasiliense...
    Mas, o que mais cativa em Brasília são as pessoas que nos fazem esquecer das origens. Como foi dito, Arnauld deixou saudades. E tantos outros que já desceram na última estação do trem da vida...
    Concordo que a atração pela linda cidade nem mesmo Newton explicaria...

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  29. Acabo de ler mais um texto seu. Desta vez, realçando as paixões de Brasília.
    É de veras surpreendente essa atração pela cidade. O clima não atrai; a ausência do mar, também. Só o Poder é dominador. Seria ele o responsável?
    Pode ser, mas ele é muito desafiador e gerador de efeitos contrariadores. No entanto, feliz de quem consegue unir o útil ao agradável. O organismo se ajusta ao clima e a a pessoa se habitua com estilo social diferenciado. Depois disso, tudo certo. Parabéns por conquistar grande sucesso.

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  30. Ah, que linda crônica que, através de Brasília, é um tributo à amizade. E que sentimento bom poder conhecer, através de sua crônica tão cheia de afetos, o amigo Luiz Arnaud. E ainda tem gente que não acredita na imortalidade.

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  31. Caramba!!! E recentemente ouvi de um ex-colega de banco, passando pela mesma situação, a mesma frase: "se você me encontrar não vai me reconhecer".
    C'est la vir!!!!

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  32. Esse corretor é terrível: C'est la vie!!

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  33. Não quero saber quem sou, morro de medo. Uma parte de mim é multidão, a outra parte estranheza e solidão. (Fagner e Ferreira Gullar).
    Se há coisas que não se devem perguntar nem para si, corre-se o risco de se surpreender com as respostas, do mesmo modo, outras coisas nunca deveriam ser ditas. Nem para si, nem para os outros. Franqueza demais às vezes é até má educação.
    Sendo assim, perdão pela sinceridade. Talvez seja preciso aprender a gostar de Brasília. Tenho até um motivo adicional para que isso aconteça. Meu coração também bate por lá e, bate mais forte, por uma razão diversa. Duas das minhas filhas e uma neta moram lá. Visitá-las é sempre um privilégio e uma alegria.
    Agora, cá entre nós, para morar mesmo, prefiro viver onde o sol nasce mais cedo.


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  34. Viver e conviver em lugares despertam tantos sentimentos .... impossível decifrál -los. Vc , com sua particular sensibilidade , do alto do sueu conhecimento do ser humano , diz :

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  35. Completando a mensagem anterior:
    diz que certas perguntas ñ devem ser feitas !
    Aqui , volto a vc : "ninguém sabe o valor de um momento até que se torne uma memória " .

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  36. Certas palavras ñ devem ser feitas !

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  37. Minha demora em postar comentário aqui, se dá por duas razões.
    A primeira é que fico meio acanhado, afinal são tantos e brilhantes os textos que postam analisando as pérolas "haytianas", que me sinto inibido, não tenho nível pra sair logo na "concorrência', assim, me contenho.
    A segunda é que este "bendito" ano de 2023 me fez passar por agruras que nunca imaginara que por elas passaria - todas na questão de saúde, minha e de familiares.
    Sobre essa crônica agora, bateu-me um comichão. Inconscientemente ou não, eu sempre achava que um dia haveria algo ou alguém que me traria a paz - eu deixaria de me achar anormal - por sempre ter o maior carinho e admiração por Brasília, sempre me sentia feliz lá, nas inúmeras vezes em que estive a trabalho, até por estadas significativas, conquanto nunca tenha morado, desde tempos remotos. Afinal, era até louvado, em conversas, alguém que execrasse Brasília, desde sua fundação.
    E logo eu, conquanto sertanejo orgulhoso da condição, mas verdadeiramente apaixonado pelo mar, como gostar tanto da cidade surgida do nada, no meio de um Planalto?????
    Enfim, cada um tem seu Deus, acredita nele. No caso aqui, o meu é Hayton Rocha, minhas agonias acabaram...

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  38. Assim com meu amigo Volney, demorei de fazer o meu comentário sobre mais essa prenda de crônica, mas não nunca é tarde para expressar um sentimento ou opinião. Entendo perfeitamente o seu gostar de Brasília, pois foi quando lá residiu que vieram suas várias conquistas para além da vida profissional; como por exemplo seus netos e tantas outras. O que nos faz gostar de algo, é, antes de mais nada, o prazer que nos é proporcionado por ele. Sempre achei que esse seria o maior motivo do paraibano ter se encantado pelo Planalto.

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  39. Que belo texto, faz lembrar da origem de Brasília na minha vida e de vários que perdemos pelo caminho aqui em Brasília e hoje tem sua presença sentida pela ausência, como diria Drumond em sua poesia. Quando você veio fazer seu curso em 1981 em Brasília eu estava chegando na empoeirada e pequena Tapejara p assumir no BB. Quando cheguei a Brasília imaginava ser por 2 anos p depois voltar aos pagos. Já se passaram 32 anos nesta cidade e sempre que me perguntam o que ela tem de bom eu falo que é um jardim, um caldo cultural maravilhoso e que "tinha" um clima muito bom. A terceira razão já não existe mais, pois o aquecimento global e a perda da guerra do cerrado p soja não nos permitem mais falar do bom clima em Brasília. Mas aqui seguimos convivendo com os amigos que fizemos e as lembranças de gente que se foi como o Marcelo Assunção, a Denise, o Artur Português, o Marcus Euricio, o Zé Nobre e tantos outros. Suas crônicas sempre provocam nossas lembranças e acho que aí reside a beleza.

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  40. Adorei a crônica e, como bem disse Mia Couto, me fez viajar em mim. Morei em Brasília por alguns pedacinhos de tempo. Tomei posse em Irecê BA em dezembro de 1983, na época de ouro do feijão. De lá, fui transferida para o CESEC Brasília. Cheguei, me instalei na 714 norte e, com apenas uma semana no Planalto Central,
    saí adida para Paracatu em Minas, depois, numa nova adição, fui para Rondon do Pará PA, retornei para Brasília e lá fiquei por algum tempo. Guardo lembranças maravilhosas. Vivi grandes experiências. Como trabalhava à noite, saía do Cesec as 23:45 e com a turma da gravação desbravávamos as noites, muitas vezes concluindo o final da madrugada em lugares inusitados como boites no CONIC. Guardo em mim muitas saudades daquele tempo. Além de bancária,
    fui artesã e cheguei a ter uma banquinha na feirinha da torre. A galera do Cesec era composta de notívagos e muito animada e, claro, não poderia deixar de brotar paixões. Em finais de semana viajávamos juntos pelos arredores, acampávamos, íamos pescar em Aruanã, foi tempo de muita farra, mas também de muitos aprendizados, amizades e amores. Na época não existiam redes sociais, tenho contato com poucas pessoas com quem convivi, mas guardo todas na memória e algumas muito especiais no meu coração. Brasília me traz ótimas lembranças. Quando escuto alguém falar mal da cidade, tomo as dores e defendo. Até me esqueço que não sou candanga.

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