Coincidências acontecem


Miguel Falabella, ator, dramaturgo, diretor, cineasta e escritor, costuma dizer que “as coincidências às vezes são soluções que a vida encontra pra mudar o rumo da história.” Esse diálogo, ocorrido em fevereiro de 2003, talvez comprove essa tese:

- Achei interessante, Paulo, o ‘discurso’ do novo superintendente do banco aqui em Brasília. A gente sempre recebe nessas horas mais planos e metas, cobrança por mais resultados...

- Como assim, Heloísa?

- Falou apenas da vida dele, desde Maceió, passando por Recife, Salvador, até chegar em Brasília. Diz que isso vai facilitar a conversa, daqui para frente, já que todos os gerentes irão saber quem ele é, por onde passou, onde errou, acertou...

- Heloísa, com esse nome... só pode ser um velho amigo de infância que não vejo há quase 30 anos”

Dias depois recebi de forma inesperada a visita de Paulo Cavalcante, que havia se transformado em pai de família e artista multifacetado - músico, cenógrafo, artista plástico, ator, cantor e compositor. Do adolescente com quem dividi cigarros, cervejas e sonhos, ficara a essência: um ser do bem, que gostava de desenhar e fazer amigos. Nem a hepatite crônica que, nos anos seguintes, evoluiu para cirrose e lhe fez um estrago terrível no fígado, foi capaz de apagar o brilho de seus olhos.

No início de 2010, o tratamento da hepatite já não fazia efeito e o estado de saúde de Paulo só piorava. Eu, àquela altura presidente da Cassi (plano de saúde que o assistia) e Magdala, minha mulher, que já vínhamos acompanhando o caso há tempos, ficamos bastante apreensivos com a gravidade da situação - aumento nítido do abdômen, icterícia acentuada, sinais de pré-falência hepática. Afinal, metade dos brasileiros que necessitavam de transplante de fígado morriam antes de conseguir doador.

Antes que as cortinas se fechassem e o espetáculo da vida terminasse sem aplausos - os médicos chegaram a comentar com Heloísa que mais um dia poderia ser fatal - , veio a notícia de que surgira um doador compatível e a cirurgia, com mais de 10 horas de duração, foi realizada com sucesso no Hospital das Clinicas da UFMG, em Belo Horizonte. Justamente no dia de meu aniversário, recebi o melhor presente que poderia desejar naquele momento: o show de nosso artista iria continuar.

Paulo diz que, se não fosse a luta sem trégua e o suporte afetivo que recebeu de Heloísa e das filhas Mariana e Ana Carolina, teria sido derrotado. Mas reconhece também que os cuidados (equipe médica, medicamentos, exames) e a boa-vontade com que a Cassi tratou cada demanda de seu caso foram decisivos para a vida normal que leva hoje em dia.

“Pois é, meu irmão, já somos sessentões mas não esqueço do dia em que nasci de novo... mesma data em que você nasceu...” lembrou-me Paulo no ano passado, na passagem de meu aniversário. Silenciei no momento, mas pensei: será que foi apenas coincidência tê-lo encontrado tanto tempo depois? E estar na Cassi na hora que ele mais precisava do plano de saúde?

Existem mais coisas entre o céu e a terra do que nuvens, estrelas e drones.



Comentários

  1. Conheço um certo " Paulo Bigodinho" que nos fazia sorrir com suas brincadeiras nos dias que sucederam a morte de nosso pai em 1972...

    ResponderExcluir
  2. Outro belo texto, Hayton! Aproveite este momento de fertilidade literária já que a pena está afiada. Bem apropriada também a crônica nestes tempos em que a CASSI, fundamental para a vida de tantas pessoas, passa por uma quadra difícil. No mais, acho que as coincidências são caprichos do acaso. Achismo. Porque de nada tenho certeza.

    ResponderExcluir
  3. Espetacular!
    Nem tudo é coincidência, mas se providência.

    ResponderExcluir
  4. Deus sempre coloca as pessoas certas, no momento certo, nas nossas vidas! 😄🙏🏻

    ResponderExcluir
  5. Acredito nos anjos que Deus coloca no nosso caminho, realizando pequenos milagres. Milagres em forma de doação, comprometimento, lealdade e amizade sincera. Coincidência? Talvez. Quem sabe uma boa dose de sorte ao encontrar o anjo certo no lugar certo.

    ResponderExcluir
  6. Não acredito em coincidências e sim na providência Divina 👏🏼👏🏼

    ResponderExcluir
  7. Com certeza, Hayton. Nada acontece por acaso e Deus nos encarrega de cumprir as missões que nos delega. Cuidar das pessoas é uma atitude muito nobre, principalmente nos dias atuais, onde vivemos em um mundo extremante competitivo e cruel. Nossos líderes continuam suas escaladas pelo poder, ignorando os princípios da ética e da honestidade. Mais um belíssimo texto!

    ResponderExcluir
  8. É uma bela história, de reencontro e amizade. De amigos que nos dão as mãos e nos apoiam, nos momentos mais difíceis. Sem vocês, queridos amigos Hayton e Magdala, e a nossa CASSI, não teríamos conseguido. Eu sei disso! Foi muito mais que coincidência. O destino conspirou a favor e vocês estavam lá na hora certa! Obrigada, do fundo do coração!

    ResponderExcluir
  9. Outro excelente texto! Quem conhece Hayton sabe da sua disponiblidade em ajudar os outros. Quem dera os líderes empresariais tivessem sua competência, humildade e sensibilidade. Parabéns amigo por este belo gesto.

    ResponderExcluir
  10. Não acredito em coincidência mas sim na providência Divina. Deus se faz presente através das pessoas boas, anjos, os quais aparecem na hora certa.

    ResponderExcluir
  11. Parabéns pelo texto e recordações. Só pessoas sensíveis como você têm a capacidade de traduzir esses tipos de momentos que permeiam nossas vidas. Forte abraço amigo.

    ResponderExcluir
  12. Tenho muita gratidão com meus irmãos Hayton e Magdala, por serem presente nos momentos mais difíceis da minha vida. Tenho tambem muita gratidão e respeito pelos profissionais e a instituição CASSI. Sem essas pessoas e sem essa instituição, hoje eu não estaria fazendo meus shows e espetáculos. Confidências não existem, o que existe são intervenções divina. Grato a todos!

    ResponderExcluir
  13. Lindas palavras que ficarão marcadas junto com meu choro que não para. Sou Marcelo, irmão do amado Paulo César Cavalcante dos Santos. Obrigado Hayton!!

    ResponderExcluir
  14. Paulinho, filho de Marisa e Claudionor, eu o conheci bem, a cerca de 48 anos, eu já estava casado com sua mãe, ele passou um tempo conosco em Recife, momentos agradáveis, tudo em Paulinho cheirava a arte, pintava, tocava seu cavaquinho, lembro-me bem de uma de suas músicas preferidas, que falava da saudade de Maceió, me ensinou a jogar xadrez, pouco tempo depois partiu para seus primeiros desafios. Brasília seria seu destino. Pouco antes do transplante de fígado, veio nos visitar, passou o dia das mães entre nós, prestando uma bela homenagem a nossa saudosa Marisa. Fica aqui a saudade e a gratidão. Um dia nos reencontraremos meu amigo e irmão.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Que chato, não?!

Perfume raro

Abacaxi de ponta-cabeça