Ela e ele (um ex-parlamentar, por sinal, muito bem de vida) moram em Curitiba-PR, onde criaram os filhos, os netos crescem e a vida segue, só lhes restando agora, aposentados, implicar um com o outro o dia todo, todo dia.
Esta semana retomaram uma briga antiga. Diz ela que ele vive dando em cima das mulheres mais jovens que frequentam um pub aconchegante e descolado, com decoração vintage, que serve uns coquetéis e petiscos maravilhosos. Ele nega. Garante que ela está ficando louca, vendo tranças e chifres em cabeça de pulga.
Ontem, ela buscou um ombro amigo numa videochamada para sua comadre Márcia, mulher de meu amigo Luizão, que a tudo ouviu porque o tom da prosa foi tão alto que o impediu de cochilar seus 20 minutos pós-almoço.
– Ele pensa que sou besta! – dizia ela. – Sou feito aquela que cantava "sinto quando alguém te interessa, mesmo quando finges que não vês..."
– Calma, comadre! – ponderava Márcia –. Vai me dizer que nunca olha pra ninguém além de seu marido? Olhar não arranca pedaço de ninguém. Lembra quando você me disse que era difícil admitir que Harrison Ford ronca, que Richard Gere arrota, que Brad Pitt peida?
– Epa! Assim, não! Artista não conta...
– Vai me dizer então que não existe nenhum gatão grisalho no seu prédio? Você não fala nada pra não desagradar o compadre, não é?
– Desagradar, não. Se eu elogiar alguém, na primeira bunda que aparecer na nossa frente ele vai esquecer que estamos juntos há mais de 40 anos. O bicho é safado mesmo. E quanto mais velho, mais sem-vergonha fica!
E veio à tona o estopim da encrenca: o noticiário sobre o imbróglio envolvendo o prefeito da cidade de Araucária-PR, que, no frescor de seus 65 anos, acaba de se casar com uma moça de 16. Dois dias antes do casório, ele havia nomeado a mãe da noiva como secretária de Cultura e Turismo.
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Imagem: Reprodução/Instagram |
Deu nos jornais que se trata do quinto casamento do insaciável alcaide. Reeleito com 47 mil votos, o bem-amado teria recentemente declarado à Justiça Eleitoral dispor de mais de R$ 14 milhões de patrimônio. Nada mal pra quem está começando uma nova vida a dois.
Aqui, legalmente é possível se casar aos 16 anos com autorização do responsável – a menina completou a idade mínima quatro dias antes de se casar. “Mas a ONU considera casamento infantil qualquer união com menor de 18”, argumenta a comadre de Márcia e Luizão. “Isso é uma violação de direitos. Pedofilia, falando português mais claro”, afirma.
A suposta prática de nepotismo é que deu visibilidade nacional ao caso. Após a repercussão, o prefeito se viu emparedado e cuidou de exonerar a sogra com menos de duas semanas após empossá-la no cargo.
Luizão me conta que, surfando no noticiário enquanto as comadres conversavam, descobriu que o Ministério Público do Paraná investiga a denúncia de nepotismo. Também existe uma análise sigilosa – seja lá o que isso significa – sobre o casamento.
O viril burgomestre concedeu entrevista ao jornal "O Popular do Paraná" declarando que o casal está bastante feliz. "Minha esposa me faz muito bem, e eu faço bem a ela...”. Nas redes sociais, ela retribuiu: disse não se importar com a repercussão do caso. "O que importa, sinceramente... É que não nos importamos!".
Ai de quem duvidar desses corações apaixonados que decidiram ficar juntos! Arrisca-se, no mínimo, a ser processado por preconceito contra idosos. Afinal, o etarismo (palavrinha na moda, hein?!) pode ser enquadrado como crime de injúria, quando alguém com mais de 60 anos tem a sua honra ou dignidade ofendidas.
A mídia, arvorando-se no papel de termômetro social, avalia a temperatura de uma possível investigação por exploração sexual, mas só na hipótese de o Ministério Público encontrar indícios robustos – de novo, seja lá o que isso significa.
Uns dizem que, apesar de esse tipo de união ser legalmente permitido no Brasil, uma menina de 16 anos sequer tem o corpo (e a mente) completamente formado e, por isso, não há que se falar em consentimento. Outros defendem que não se pode acusar de ambição material uma criatura inocente, sem maldade.
Mas para a comadre de Márcia, no entanto, "houve, sim, jogo de interesses, pois a mãe da ninfeta foi nomeada pouco antes do casamento. E se o sujeito recompensou a mãe por autorizar a filha a se casar, teve exploração sexual..."
Ao perceber que meu amigo Luizão estava acordado, ouvindo o desenrolar da prosa, Márcia tenta envolvê-lo:
– E você, meu bem, o que acha disso?
– Sei lá! Não vou me meter em conversa de comadres, mas...
– Mas o quê?
– Pode atrapalhar os planos do compadre. Outro dia ele me contou que será candidato a prefeito, aqui na região metropolitana, nas próximas eleições...
– Só capando aquele velho safado! – despediu-se a comadre, lacrando a videochamada.
E Luizão, enfim, pôde cochilar.