Diz o escritor Ruy Castro que frases feitas são aquelas que entram por um ouvido e saem pelo outro sem um estágio intermediário no cérebro. Mesmo assim, anote aí: tudo evolui na natureza. Tirando, claro, certas figuras que conhecemos.
Nós, humanos, não somos exceção – ainda que alguns dos nossos hábitos façam pensar o contrário. Depois de milênios, aqui estamos, bem diferentes de nossos tataravós. Não só demos uns pulinhos na árvore genealógica, acompanhando gorilas e chimpanzés, mas também nos empoleiramos, com todo o nosso charme, no topo da cadeia alimentar.
Se nossa memória fosse um pouco melhor, talvez nos lembrássemos daquele dia em que descemos das árvores para dar uma voltinha no chão. Ficamos de pé, esticamos as pernas, encolhemos os braços e, ao longo da jornada (obrigado, fogo, roda e bússola!), nosso cérebro sofreu um upgrade que faria qualquer software de última geração corar de inveja. O resultado? Um salto enorme em aprendizagem e socialização.Avançamos tanto que começamos a trocar ideias, domesticar animais (e alguns chefes, vizinhos etc.), criar sociedades e, veja só, regras de convivência. Cruzamos oceanos, exploramos o espaço e, vira e mexe, uns aos outros, com uma facilidade impressionante.
Mas, o que o futuro nos reserva? Será que partimos para uma versão 2.0 de nós mesmos? Além da seleção natural, que outras colheres mexem a panela de nosso caldo genético? Uma coisa é certa: assim como escalamos o pico da montanha evolutiva, há sempre o risco de um escorregão. E qualquer vascaíno pode dar uma aula sobre quedas e recomeços.
Comparados aos nossos ancestrais hominídeos, somos mais altos. Uma pesquisa de 2016 da revista eLife mostra isso: os holandeses cresceram em média 19 cm em um século, os asiáticos até 20 cm. E nós, brasileiros? Bem, ganhamos uns 8,6 cm – avanço modesto, porém melhor do que nada! Nem vou falar do crescimento lateral, para não ferir suscetibilidades após as festas de fim de ano.
Esse "viés de alta" parece estar ligado à dieta: mais proteínas, menos miojo. Mesmo enquanto uns se fartam de nutrientes, muitos ainda esperam um pedaço de pão. E ser mais alto tem seus desafios – problemas nas juntas, certos tipos de câncer. Mas os baixinhos também não vão sumir do mapa, porque, afinal, genética é importante, mas não é tudo. Guerras, fome e doenças ainda dão as cartas nesse jogo evolutivo.
As mudanças não param por aí. Estamos ficando mais franzinos e curvados – dizem que vamos acabar nos transformando em emojis devido ao uso excessivo de mensagens eletrônicas e de páginas da web. Você já viu dedos com aparência de tentáculos de polvo por causa da digitação? E a Academia Americana de Oftalmologia avisa: até 2050, metade dos seres humanos pode estar usando óculos graças à obsessão por telas.
Um estudo de 2019 da Universidade de Potsdam, na Alemanha, sugere que a virtualidade excessiva pode nos levar a uma vida sedentária e ao ganho de peso. Nosso esqueleto enfraquece, os cotovelos encurtam. E nossos pés, antes acostumados a andar descalços, agora estão mais longos, fracos e achatados por conta da rotina moderna. E ainda tem quem use sapatos altos, apertados, de pontas estreitas.
Quanto ao crânio, também entrou na onda das mudanças. Com comidas mais macias, nossas mandíbulas e dentes deram uma encolhida. Isso facilitou a fala, mas nossa mordida anda cada vez mais frágil, se comparada a outros animais com estrutura óssea similar. Exceções para Mike Tyson e Luisito Suárez.
Para não dizer que só falei de horrores, a novidade é que recentemente alguns cientistas descobriram que um macaco pode reproduzir a fala humana, graças ao seu trato vocal capaz de emitir os mesmos sons que nós. Essa descoberta, publicada na revista Science Advances, pode ser um sinal de que, talvez, os macacos tenham algo a nos ensinar sobre a humanidade. Se não enveredarem para o funk, o pagode ou o sertanejo universitário, tudo bem!
Já se sabia que traços de comportamento humano podem ser encontrados nos símios. Eles escolhem amizades baseadas em afinidades, se revoltam com injustiças e têm consciência da morte. Mas, falar? Opinar sobre a vida alheia ou discutir a relação com a cara-metade? Isso é revolucionário. Daí a assistir reality shows será um pulo.
Através do uso de imagens de raio-X, os pesquisadores 'desenharam' a anatomia vocal do nosso primo distante. Após examinarem as imagens, eles identificaram 99 diferentes possibilidades de expressão vocal, incluindo as cinco vogais. Já pode até arriscar compor uma nova versão do famoso “Prefixo do Verão” (Aê, aê, aê, aê... Ei, ei, ei, ei... Ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô) para os adeptos do axé music.
Brincadeiras à parte, com os 'primos' entrando no jogo, quem sabe não encontraremos soluções mais inteligentes e racionais para os grandes flagelos da humanidade – doenças, fome e guerras – e adiamos o fim da aventura humana na Terra.
No fim das contas, mais do que os humanos, são os bichos que mais nos ensinam sobre o que realmente significa ser humano.