segunda-feira, 1 de julho de 2019

Sem confusão, qual é a graça?


O tal do VAR (do inglês: Video Assistant Referee) anda deixando o futebol cada vez mais sem graça, insosso, morno. VAR, para quem não sabe, é um assessor de luxo que analisa comendo pipocas as decisões tomadas pelo árbitro principal de uma partida de futebol com o uso de imagens de vídeo. Ainda não faz parte das regras do jogo, mas, daqui a pouco a sua incorporação deverá ser julgada pela International Football Association Board.

Andei vendo alguns jogos do Brasileirão e da Copa América e penso que a fogueira que sempre aqueceu o futebol tende a virar cinzas com o anticlímax proporcionado pelo VAR. Em tese, a tecnologia aplicada deveria ser em benefício do próprio esporte, como é no vôlei, automobilismo, natação, tênis por exemplo. Não é. Emoção e razão são água e azeite: não se misturam de jeito nenhum, pelo menos em algo que, antes de tudo, é adrenalina pura.

Mesmo o vascaíno, acostumado com arbitragens esquisitas — tanto quando seu time enfrenta Flamengo ou Corinthians, como ao ser beneficiado em pênaltis marotos ao atuar em São Januário —, nota que o futebol anda perdendo a graça quando um joelho ou um pé à frente determina impedimento e invalida um gol, frustrando não só a torcida que acabara de urrar pela desgraça do adversário, como também o atleta em seu esforço para bem executar sua arte.

É duro ver o árbitro, por cinco ou seis minutos — que nunca são totalmente acrescentados antes do final do jogo — depois do lance que validara a olho nu, voltar atrás e recomeçar a partida como se nada tivesse acontecido, desgastando a todos, inclusive os torcedores no estádio ou pela TV, que não sabem se vibram ou sofrem com o mesmo lance.

Determinados eventos — se é que vocês me entendem — não resistem a tanto tempo de paralisação nem quando os envolvidos ainda estão cheios de hormônios. O sangue esfria. Pior que os atletas e os treinadores já se deram conta que, em qualquer lance duvidoso, podem cobrar o uso do VAR. Pressionam dentro e fora do campo e o árbitro acaba mais perdido do que surdo em bingo de cartela cara.

E quem garante que um árbitro principal com interesses inconfessáveis vai aceitar o alerta da mesa do VAR se “seu” time correr o risco de ser prejudicado numa análise mais detalhada de um lance? É só fingir que nada escutou e sacolejar as mãos no típico “segue o jogo” que fica tudo por isso mesmo. Ou, se quiser manter o resultado parcial de uma partida, basta paralisá-la com várias simulações de auscultas ao VAR.

Basta conferir se a bola entrou ou não, em caso de gol. No mais, é evidente que se insistirem nisso, o nível de sofisticação do sistema tecnológico irá evoluir tanto que daqui a pouco um beiço de pulga ou um cabelo de sapo poderá deflagrar a terceira e definitiva guerra mundial a partir de um estádio de futebol. Ficará mais perigoso do que barbeiro com soluço.

É preferível tolerar aquela discussão interminável das noites de domingo e segunda-feira, onde analistas passam horas discutindo sobre as possíveis alternativas para um passado cuja versão final o árbitro já bateu o martelo no calor da disputa e no sopro do apito.


Do jeito que as coisas andam, acabarão nos roubando até o direito de sentir-se injustiçado ou de terceirizar a culpa pelos nossos fracassos. Aí o futebol só terá graça naqueles últimos campinhos de terra batida onde a emoção goleia a razão, os times são escolhidos no “par-ou-ímpar”, não precisa de árbitro, bola “prensada” e da defesa, falta só se houver escoriações generalizadas ou se falar na mãe e ganha quem fizer o último gol antes do anoitecer.

50 comentários:

  1. pois eu não suporto injustiças e pra mim o VAR é muito bem vindo, cria -se uma nova emoção no lugar daquelas de domingo à noite e segunda-feira.

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    1. Ser vítima de injustiça tem seu lado positivo, Fada. Tem coisa melhor do que, em determinadas situações, poder atribuir a a terceiros a culpa pelo que nos acontece?

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  2. Como ex árbitro profissional e totalmente contrário ao sistema do VAR não poderia deixar de parabenizar pelo excepcional texto, inclusive peço autorização para ser pautado e comentado em minhas palestras. Forte abraço e um domingo abençoado .

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    1. Se não fosse Ex, agora estaria estudando e divulgando o VAR.

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  3. Eu morro de medo de ficar rabugento assim quando chegar na sua idade. Hahahahahahaha
    Acho que encontraremos um equilíbrio para essa evolução inevitável. As reações são similares às de quando foram introduzidas as regras de impedimento e não devolução da bola pra o goleiro.
    Eu ia argumentar mais, porém quando li sobre o Vasco ser prejudicado pela arbitragem vi que era um delicioso conto de humor reflexivo.

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    1. Velho é o mar... ainda assim é cheio de onda e de história pra contar. 😜

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  4. ‪Meu vizinho assiste o jogo com alguns segundos de atraso em relação a mim. De vez em quando gosto de gritar um gol sem ser, só pra tirá-lo da previsibilidade.
    .. estou devolvendo de certa forma a emoção tirada pelo VAR ������

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    1. Grande Dedé, um grande provocador de emoções! Essa é muito boa!!

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  5. É evidente que com o VAR a emoção foi escanteada, descarregar a adrenalina durante o gol é coisa do passado, pois logo em seguida o mesmo pode ser anulado nos deixando com cara e jeito de bobo, no entanto se o VAR foi bem utilizado sem as mazelas e manhas do árbitro acredito os resultados serão mais justos, mesmo perdendo um pouco do glamour.

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  6. Dessa matéria eu não entendo mas adorei o perigo “do barbeiro com soluço” kkkk

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    1. ...e se ele tiver bebido umas, Peu, aí o bicho vai pegar mesmo!

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  7. O VAR, ao meu ver, corrige lances irregulares e isso impede resultados injustos, mas, por outro lado vem sendo mal aplicado no futebol sul-americano. Demoram muito para analisar os lances e essa demora realmente incomoda e contribui para que a partida se torne chata de ser assistida por nós!

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  8. Já se foi o tempo que decisão de juiz era irreversível. Mesmo assim é melhor do que aqueles auxiliares ao lado do gol, que nada viam contra o Flamengo ou Corinthians. Kkkkkk

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  9. Hayton, também concordo com você, parte da graça do futebol é a polêmica do foi não foi...Parabéns pela provocação ao debate

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  10. Belo texto. Mas sou a favor do VAR, apesar de concordar que o futebol ficou chato. Cansei de ver o Vasco perder título para o Flamengo com a ajuda do juiz ( e da Globo). Mas será necessário fazer ajustes. O árbitro também fica comendo pipoca, do campo, esperando as observações do VAR.

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    1. Parece ser um texto do Eurico Miranda psicografado pelo Chico Xavier.

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  11. A evolução tirando a originalidade, excluindo a melhor parte desse palco que todos gostamos, a discussão dos pontos de vista. Quisar tragar justiça.

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  12. Eu também, Fonseca. Desde que limitado à conferência se a bola entrou ou não no momento mais solene do esporte: o gol. O restante, é tudo discutível, interpretativo, com ou sem a ajuda do vídeo.

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  13. Essa eu não tenho cacif para comentar. Só digo que adorei a lembrança da estória do tal " Gol da lua"

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  14. A várzea é reduto do jogador raiz, onde a butinada corre solta. Por isso que escolinha de futebol - onde o respeito é a regra - não revela nenhum jogador de expressão.
    ACCampos.

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  15. Engula o grito, o gol não valeu. Segura o grito, o gol vai ser validado. Acho que vou é ouvir música.

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  16. Até gosto do VAR. Criou um novo tipo de emoção, a do suspense quando o juiz leva a mão à orelha e, depois que faz o tal gesto retangular, fica revendo o lance 'sub judice' por vários ângulos. Só acho que, em prol da dinâmica do jogo, o assessor de luxo que fica comendo pipoca na cabine, que já sabe se o lance é válido ou não, poderia só passar o veredicto ao juiz de campo, ao invés de parar o jogo e mandá-lo rever a jogada para chegar a mesma conclusão. Se fosse pra acabar com alguma coisa no futebol, seria com o impedimento. Nunca vi regra mais sem sentido do que essa.

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    1. Se não houver o impedimento, Rodrigo, os treinadores colocarão um atacante tosco feito Dario “Peito-de-Aço” o tempo inteiro “marcando” o goleiro adversário, como um pivô de basquete. Aí é que o futebol ficaria esquisito.
      A alternativa seria estabelecer que o impedimento só ocorra a partir da grande área, o que contribuiria inclusive para que o campo fique menos congestionado entre as duas meia-luas.
      E se quiser melhorar ainda mais, é só reduzir o número de jogadores para 20 e vedar o recuo da bola pro campo de defesa depois que ultrapassar a linha divisória.
      De cara, surgiriam novas estratégias de jogo.

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  17. Pior que o VAR é o atual futebol brasileiro. E ainda há quem vibre com atração tão fuleira e, essa sim, e enfadonha. Chatices de quem viu e acompanhou o futebol de Pelé, Garrincha, Didi, Gerson, Nilton Santos, Tostão, Rivelino etc. e tal.

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  18. Depois do VAR, Corinthians e Vasco não ganharam mais nada. Coincidência?

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  19. Excelente texto, apesar de achar que é um caminho sem volta, concordo que muitas vezes tira a emoção da partida. Precisa achar um meio termo, principalmente pra quem está no estádio e por muitas vezes fica sem saber até o que está sendo analisado

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  20. Faço este comentário como quem ainda participa das “peladas” e das competições de aposentados. Foram muitas vezes que o sentimento de “ter sido roubado” num jogo , por erros de árbitros, disse que não jogaria mais. Depois, com a “cabeça fria” (não sou palito de fósforo), tudo voltava ao que era antes e, sigo no campo. No entanto, lembro muito bem dos comentários e comparações que surgiam: “ah se fosse no tênis” ou “se fosse no vôlei”, as imagens mostrariam o que realmente aconteceu.
    Concordo que a demora tem sido demasiada, que o tempo não tem sido devidamente compensado, mas é inegável que muitas injustiças têm sido evitadas. Acho que com o passar do tempo as análises devem se tornar um pouco mais rápidas e nós mais acostumados com elas. O futebol, vai continuar sendo nossa paixão, apesar do VAR ou com o VAR.

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  21. O VAR é irreversível . Poderíamos reduzir área para valer o impedimento a 1/4 do campo, ou acabar com o impedimento, o que forçaria o time a espalhar mais em campo. Outra opção , seria paralisar o cronometro em bola parada. Agora como o voto contrário vem de vascaindo, faz parte. Rsrs

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    1. Em resposta ao comentário de Rodrigo Gurgel, mais acima, propus no mesmo momento que você algo parecido para acabar com essa zona de impedimento a partir do meio do campo.
      A alternativa seria estabelecer que o impedimento só ocorra na grande área, o que contribuiria inclusive para que o campo fique menos congestionado entre as duas meia-luas.
      E se quiser melhorar ainda mais, é só reduzir o número de jogadores para 20 e vedar o recuo da bola pro campo de defesa depois que ultrapassar a linha divisória.
      Quanto a Vasco e Flamengo, digo que futebol é como avião: o que sobe, uma hora desce. Nada fica a vida inteira no céu ou no chão. Não pode é estar no céu e só ficar no “cheirinho”.

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  22. Acho o VAR um grande avanço, sempre que beneficia o time da gente. “Se é que vc me entende”. Kkkkkk

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    1. Pois é, Zé, depois que o sangue esfria, o jogo perde a graça, não é mesmo? 🤣

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  23. Como dizem que o inferno está cheio de gente que tinha boas intenções... se a intenção era melhorar, acho que complicou... mas acreditem, ainda irá piorar mais, já ouvi dizer que querem chipar a bola e as chuteiras dos jogadores... quem sabe assim, com mais tecnologia, consigam complicar mais ainda...

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  24. Espero que o var evolua como no vôlei ou no tênis

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  25. A tecnologia no futebol veio para ficar e é benéfica. Não bastasse o árbitro e bandeirinhas, foram incluídos os árbitros de linha, além do quarto árbitro, já existente. Somente a tecnologia resolverá. A regra é clara... imagino o futuro do futebol sem árbitros (atenção aos profissionais do apito!), só a tecnologia atuando através da inteligência artificial.... deve começar já, já pelo Japão. Alguém duvida!?

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  26. Não precisa esperar nem ir tão longe, Gilberto! Na várzea já é assim: não existem árbitros e “os jerimuns se ajeitam no andar da carroça”. Acabam vencendo os melhores, os mais fortes. Mas toda regra, apesar de clara, tem exceções.

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  27. O texto deu muita nobreza a algo pouco nobre. O VAR reduz algumas injustiças e cria outras. Será a salvação de muito juiz ruim.

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  28. Este comentário foi removido pelo autor.

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  29. Com algumas ressalvas, sou favorável ao VAR. Acredito que essa nova tecnologia, se bem utilizada, pode evitar que injustiças continuem se repetindo no futebol.
    Quais seriam as ressalvas? Há um exagero no uso do VAR, para lances que poderiam e deveriam ficar por conta da interpretação do árbitro de campo.
    O VAR poderia se concentrar na marcação de impedimentos escandalosos não observados pelos “bandeirinhas”, de pênaltis claros que alguns árbitros não enxergam (ou alegam não enxergar), na confirmação de gols quando a bola ultrapassa a linha do gol ou na invalidação de gols nos casos em que a bola não ultrapassou a linha.
    Vi muitos jogos – e até campeonatos – decididos por erros grosseiros de arbitragem. Erros que poderiam ser facilmente evitados se, à época, existisse o VAR. Por exemplo: a França foi à Copa de 2010 “graças” a uma jogada de mão do Henry, que acabou resultando no gol que eliminou a Irlanda. E aqui no Brasil temos muitas situações semelhantes, de impedimentos escandalosos não marcados, de pênaltis claros também não marcados.
    Não tenho ilusões: os árbitros mal-intencionados (em campo ou na salinha do VAR) continuarão encontrando “justificativas” para favorecer “times da casa” ou “times mais poderosos”. Para resolver isso, serão necessárias outras medidas.
    Concordo com quem alega que a “razão” do VAR tem sido, muitas vezes, um balde de água gelada na “emoção” que deve estar presente nos grandes estádios e nas “peladas” de fim de semana ou fim de expediente. Mesmo com essa perda, acredito que muitas injustiças deixarão de ser cometidas, sempre que o VAR for bem utilizado. Em nome de mais justiça no placar, aceito perder um pouco da emoção do futebol.

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    1. Carái véi... botou pra lenhar, como dizem os baianos. Disse tudo e algo mais. Show!

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    2. Generosidade sua, meu caro amigo!

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  30. Esse VAR é uma chatice!
    Agora a gente não sabe se vibra ou espera o VAR confirmar pra depois vibrar. Num jogo desses, comemorei três vezes e os gols não valeram.
    Na maioria das situações, nada que possa ser detectado pelo olho humano, como: a ponta da chuteira do atacante estava à frente.
    Acho um saco! Espero que encontrem um equilíbrio.

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  31. Verdade, meu Amigo. condenaram a emoção, a um triste fim, ainda que parcial, no futebol. Sempre achei que o erro de árbitros, era o "tempero" das inesquecíveis conversas pós jogo. É verdadeiramente uma grande pena, trocar a emoção do erro eventual, pelo lado "certinho" do futebol.

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  32. VAR tomar banho. Foi GOLLEGAL como ecoava no saudoso Maracanã quando se jogava futebol de primeira qualidade no Brasil.

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  33. Também tenho esperança na evolução do VAR. Ainda temos muita subjetividade envolvida.

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  34. É preciso partir de um pressuposto - para mim duvidoso - de que o futebol só tem "graça" e só é "paixão" se a famosa catimba nele estiver contida. Isso implica aceitá-la como mecanismo intrínseco da "graça" do futebol, algo que, a meu sentir contraria o "fair play". Ademais, por que só ao futebol seria dada essa prerrogativa? Tal como em tantos aspectos da vida, sou pela opinião de que o provadamente certo assim o é; o errado, errado é. Sem catimba!

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